terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

UCRÂNIA: A MIRAGEM DA PAZ OU A PAZ DA MIRAGEM?



Rui Peralta, Luanda

Segundo a ONU desde Abril de 2014 a Janeiro de 2015 os números da desgraça causada pelos combates entre as forças armadas ucranianas e as forças populares de Donetsk e de Luhansk elevam-se a 5 mil e 300 mortos e mais de 1 milhão e 500 mil deslocados. A intensificação dos combates (antes dos acordos de Minsk assistiu-se a uma escalada violenta, marcada pela ofensiva - falhada - do exercito ucraniano) levou a administração Obama a considerar (embora os serviços de informação russos refiram que chegou a ser efectuada, pelos USA, uma operação-relâmpago de entrega de armas e munições ao governo de Kiev, durante as conversações em Minsk). Os USA já fornecem equipamento militar não-letal, mas alguns responsáveis norte-americanos pretendem alargar o leque  de fornecimento, colocando espingardas, metralhadoras e armas antitanques â disposição de Kiev.

Enquanto isso o ex-líder da URSS, Mikhail Gorbatchev, acusou o Ocidente de mergulhar o mundo numa nova guerra fria. Se atendermos nas palavras de Jen Psaki, porta-voz do Departamento de Estado, ficamos a saber que o objectivo dos USA é "alterar o comportamento da Rússia" e que para atingir esse objectivo a Casa Branca analisa "um vasto leque de opções", as acusações de Gorbatchev possuem um profundo significado, porque descrevem, como um quadro hiper-realista, o actual cenário.

Ora, é nesse cenário que a posição da Alemanha e por arrasto da maioria da U.E. (sendo a minoria encabeçada pelo Reino Unido, um partidário incondicional da nova guerra fria) que assumiu a conversação directa. Minsk foi, assim, uma conversa directa entre Merkel e Putin, tendo Hollande como testemunha e Poroshenko no papel de aluno com orelhas de burro, que teimosamente teima em olhar para o outro lado do Atlântico, esquecendo-se que no Velho Mundo os novos-ricos vindos do Novo Mundo não têm o "pedigree" necessário para efectuar estes negócios, que vêm do tempo em que o Novo Mundo ainda não tinha lugar no Mundo, porque o Velho Mundo ainda não o colonizara.

O acordo obtido em Minsk é frágil, mas contem medidas de curto-prazo (no âmbito do cessar-fogo) e de médio-prazo (a alteração na Constituição de Kiev). No curto-prazo o cessar de fogo obriga á retirada imediata da artilharia pesada, de ambos os lados, para uma distância não inferior a 140 km da frente. Tem em Debaltsev (uma cidade separatista onde decorrem fortes combates) o seu ponto fraco. Por outro lado o acordo permitirá á Ucrânia receber um balão de oxigénio para a sua economia - através do FMI - no valor de 17 mil e 500 milhões de USD, evitando (ou adiando, se o cessar-fogo não for implementado e o acordo não for cumprido) a bancarrota do país.

A médio-prazo o acordo prevê alterações na Constituição ucraniana que garantirão um estatuto especial às regiões fronteiriças com a Rússia (o que representa um esboço das futuras dinâmicas geoeconómicas entre a U.E. e a União Euroasiática) e uma total autonomia a Donetsk e Lushensk. Por sua vez a Rússia garantiu a sua presença nas negociações com a Alemanha a França com vista á reconstrução das Republicas rebeldes, processo que inicia-se com a permissão das transferências bancárias e com o reinício das  actividades bancárias nestas regiões (um bolo repartido a três: Alemanha, França e Rússia).

Afastada deste processo a Casa Branca reagiu ao acordo com algumas cautelas e Perry limitou-se - amuado - a um apelo ao cumprimento do cessar-fogo (nos bastidores os USA prosseguem as pressões sobre a U.E. para auxiliar militarmente o governo de Kiev, contando com a Grã-Bretanha e com os lobies dos monopólios globalizadores do sector da defesa e da segurança).

Os separatistas (que não estiveram em Minsk) apoiaram o acordo (Putin, com o apoio discreto de Hollande e de Merkel, forçou Poroshenko a negociar directamente com os separatistas) de 13 pontos e um anexo sobre o estatuto de autonomia. Alexander Zakharchenko, dirigente da Republica Popular de Donetsk considerou o tratado como "uma importante vitória para as Republicas Populares de Donetsk e Luhansk" e Igor Plotnitsky, líder das forças rebeldes separatistas da Republica Popular de Luhansk considerou o acordo como uma "hipótese para a Ucrânia alterar a sua Constituição e o seu comportamento".

O cessar-fogo iniciou-se à meia-noite e 1 minuto (hora local) do dia 15 e é monitorizado pela Organização para a Segurança e Cooperação Europeia (OSCE), o que parece não agradar a Kiev que já pediu a intervenção de uma força de paz da ONU (um indicador negativo. Aparentemente a camarilha de Kiev - sem "pedigree"- dispõe-se a mudar de dono, trocando Bona por Washington, um tique comportamental característico dos rafeiros). Kiev faz os possíveis por desacreditar a garantia de não ingerência e de respeito da integridade territorial ucraniana oferecida pela Rússia e não vê com bons olhos (próprio da miopia em pacientes com arteriosclerose) o facto de a U.E. "reforçar" (na cóptica distorcida da oligarquia de Kiev) o papel da Rússia nas negociações trilaterais (Ucrânia, U.E. e Rússia) sobre política energética e fornecimento de gás russo (Talvez Kiev pretendesse a participação de Washington, transformando o triângulo em quadrado, para facilitar a actuação do Pentágono).

O Partido da Nova Guerra Fria

Os ideólogos da Nova Guerra Fria reuniram-se recentemente e apresentaram-se, publicamente, em forma de "troika", ou de triunvirato. A Brookings Institution, o Atlantic Group e o Chicago Council on Global Affairs publicaram um relatório onde consideram urgente prover ajuda militar a Kiev, no valor de 3 mil milhões de USD. Strobe Talbot, ex-Secretário de Estado, Presidente da Brookings Institution e coautor do relatório, considera que houve um "acto de guerra por parte da Federação da Rússia" e que os acontecimentos na Ucrânia revelam uma "invasão literal, levada a cabo pelas forças armadas russas. É uma ocupação efectiva de vastas áreas da Ucrânia". Segundo Talbot esta é a "maior ameaça á paz na Europa e na Eurásia e uma ameaça aos interesses dos USA".

Este documento, colocado na mesa dos decisores em Washington e na NATO é um texto de marketing do monopólio globalizador da defesa e da segurança (um dos cinco monopólios globalizadores, sendo os restantes: tecnologia, finanças, exploração de recursos naturais e comunicação social), o monopólio mais agressivo, que nos últimos anos, fruto dos incomensuráveis lucros que gera, ataca em toda a extensão da economia-mundo, aparecendo como parceiro insubstituível dos restantes monopólios (o seu papel agigantou-se com o 11 de Setembro) e dos Estados, tanto a Ocidente como a Oriente, a Norte e a Sul, nas economias avançadas e nas emergentes, do Novo Mundo ao submundo da miséria humana e da pobreza generalizada.

Em paragem forçada durante a Ordem Mundial estabelecida após a II Guerra Mundial (1945 - 1995) este monopólio surge agora revigorado, depois de ter hibernado meio-século. Despertou, cauteloso, na segunda metade da década de oitenta, desenvolveu-se sem dar nas vistas na década seguinte, acompanhando o desenvolvimento dos restantes 4 monopólios e aproveitando os recursos destes. A 11 de Setembro, quando o poder dos monopólios globalizadores  estava cimentado, surge a oportunidade deste sector do Capital afirmar o seu poder e influencia. Daí para cá assistimos a uma louca cavalgada (ou talvez a um estouro de manada) que espezinha a paz, a estabilidade, os direitos, liberdades e garantias. Este é um monopólio que utiliza os burocratas como agentes comerciais, o aparelho repressivo dos Estados (Forças Armadas e Policias) como fonte de financiamento camuflado e - através da insegurança diversa e do terrorismo - as sociedades humanas como agentes publicitários. Fosse eu crente e consideraria este monopólio como o Anticristo, ou o Grande Satã...

Washington como parte do problema

Os mais de cinco milhões de pessoas que habitam as regiões orientais da Ucrânia sentem na pele, na carne e na alma, os "negócios" deste monopólio, entranhado no aparelho estatal de Kiev, que submeteu a nova oligarquia ucraniana aos seus desígnios (o mesmo já aconteceu na Geórgia). Estas populações habitam por aqui á séculos. Os antepassados instalaram-se, os tetravôs já eram bisnetos dos que por aqui nasceram e por aqui foram, nascendo, vivendo, procriando e morrendo, geração após geração  homens e mulheres.

Para a comunicação social dominante no Ocidente (e para a maquina de propaganda de Kiev) estes homens e mulheres, são "bandos separatistas", "grupos terroristas a soldo de Moscovo", "marionetas de Putin". Se fossem isso tudo não estariam a morrer, não teriam um número tão elevado de desalojados, nem andariam a refugiar-se nos abrigos, para fugir aos bombardeamentos de Kiev (mais de um milhão de pessoas é forçada a pernoitar nos abrigos, regressando a casa durante o dia. As forças governamentais de Kiev costumam bombardear as áreas residenciais de Donetsk  e da região de Luhansk durante a noite). Têm apoio russo? Claro que têm, da mesma forma que Kiev tem apoio do Ocidente.

As forças governamentais de Kiev recebem treino e instrução militar da NATO. O 2° Regimento de Cavalaria dos USA, no início deste ano foi enviado para as Republicas Bálticas, onde se desenrolou um exercício da NATO. O General Ben Hodges, comandante-geral do Exercito norte-americano estacionado na Europa, foi o responsável pelas acções de formação que foram efectuadas após o exercício. A seu mando foram enviados 200 tanques e largas dezenas de veículos de transporte de tropas, entregues na Letónia, Lituânia, Estónia, Polónia, Romênia e Bulgária. Actualmente Hodges e "sus muchachos" encontram-se em Kiev, instruindo a Guarda Nacional ucraniana.

O Partido da Guerra está em marcha e com ele os negócios da guerra e da segurança. Figuras como Talbot e Hodges são "bonecos belicistas" ao serviço dos falcões da Casa Branca, lobistas que tentam amedrontar as pombas. Os "Senhores da Guerra" de Washington, "Guardiões da Segurança" impõe-se nos negócios e na política. Sob a administração Obama prossegue "a modernização das armas nucleares" (como referiu Obama).

A CIA infiltrou as organizações que foram para a rua durante o Maidan (fossem elas liberais, neoconservadoras, ultranacionalistas ou fascistas), como já o fizera durante a "Revolução Laranja". A NATO foi a responsável pela instabilidade que conduziu á guerra civil na Ucrânia. Os USA são os promotores da discórdia, conforme se pôde verificar em Minsk e agora, durante o cessar-fogo.

Desde Abril de 2014 Kiev afirma que as operações militares em curso estão inseridas no "combate global ao terrorismo", um produto de grande consumo e de enorme lucro, amplamente divulgado pelo aparelho propagandístico camuflado de comunicação social. Para Kiev não existem rebeldes ou opositores, apenas terroristas. Para Kiev não existem questões históricas-culturais a resolver. É tudo como um filme norte-americano de série B, ou como as legendas da BD: Catrapum! Pum! Pum!

Enquanto Poroshenko continua a espalhar a sua idiotice na comunicação social (a ultima refere-se á "semelhança" entre as guerras na Síria e na Ucrânia. Tal semelhança, a existir, só no bombardeamento ás áreas civis. De resto a Síria é um país agredido e o governo de Kiev um Estado agressor, pelo que qualquer semelhança passa pela inversão da imagem no espelho), Washington diaboliza Putin, que por sua vez não é flor que se cheire, mas que - ao contrário de Washington - é parte da solução.

Aliás, na Ucrânia, aplica-se (e mais adequado não há) a lei de Pareto (80 / 20): 20% do problema é constituído por Poroshenko, o governo de Kiev e os bandos fascistoides; 80% é o papel dos USA...

Alemanha: solução final?

Ângela Merkel, a chanceler alemã, afirmou (perante Obama) que a "Alemanha não suporta uma Ucrânia em guerra". A Alemanha mantem as sanções á Rússia e aposta na diplomacia e, aparentemente, tomou conta das operações no terreno, conjuntamente com a Rússia. 
E esta é uma questão histórica. Rússia e Alemanha mantêm um tradicional relacionamento no que respeita à Europa de Leste e acumulam muitas lições do passado. Falam com conhecimento de causa dos problemas da região e partilham a convicção que será das negociações (e não da via militar) que nascerão soluções para os diversos problemas que a região comporta.

A Alemanha tem responsabilidades políticas na desestabilização da Ucrânia (tal como na desintegração da ex-Jugoslávia, em toda a região balcânica e nas Republicas Bálticas) e por uma razão: reassumiu o papel-chave geopolítico e geoeconómico que foi impossibilitada de prosseguir na Ordem Mundial pós II Guerra Mundial (1945 - 1995). O país é determinante na economia-mundo, afirma a sua hegemonia na U.E. e nos palcos geoeconómicos mundiais (observe-se o seu relacionamento com a USA, a China e com a Rússia).

A Alemanha não será a "solução final" da Ucrânia (a solução compete aos ucranianos), mas, tal como a Rússia e ao contrário dos USA, é parte da solução...

O (in)cessar-fogo

Debaltsev é um importante nó rodoviário e ferroviário do Este da Ucrânia, crucial para Donetsk e para a política do governo de Kiev, que recusa-se a perder o controlo sobre a região, pressionando militarmente a região. È aí que reside o ponto mais difícil de implementação imediata do cessar-fogo.

Durante Janeiro e Fevereiro as forças de Kiev foram cercadas, nesta região, pelas forças populares de Donetsk e quando o acordo de Minsk foi assinado, as unidades ucranianas continuavam cercadas. Poucos desenvolvimentos foram conseguidos, posteriormente e situação no terreno continua complexa para Kiev, que recusa-se a aceitar a derrota das suas forças e partiu para uma campanha de falsas acusações â Rússia, o que em nada resolve o assunto.

As forças separatistas acusam, por sua vez, o governo de Kiev de bloquear a actuação dos observadores da OSCE. O vice-chefe da missão da OSCE, o suíço Alexander Hugh, assinalou que ainda não estavam criadas, na região, as condições mínimas de segurança que permitem aos observadores exercer as suas funções. Referindo-se a este assunto a porta-voz da Comissão Europeia, Catherine Ray, apelou ao fim dos combates e ao cumprimento do cessar-fogo. Enquanto isso Andrei Lissenko, porta-voz das forças governamentais de Kiev acusa a Rússia de ter enviado aos separatistas 12 carros de combate e 54 camiões carregados de munições.

O Conselho de Segurança da ONU reuniu-se e considerou que o cessar-fogo tem de ser imediatamente cumprido por ambas as partes, para que os observadores cumpram a sua missão. Aos poucos a situação parece melhorar e tanto Kiev como os separatistas iniciaram a retirada da artilharia pesada. Mas a situação ainda não é de cessar-fogo...continua no ar uma sensação de desconfiança e um clima de predominante "(in)cessar-fogo"...

Pax Russa ou Pax Germânica?

Um quarto de século depois da queda do muro de Berlim a Alemanha apresenta-se ao mundo na plenitude dos seus atributos. Por sua vez nestes últimos 25 anos a Rússia viu, enquanto URSS em agonia, depois como Comunidade de Estados Independentes e agora como Federação Russa, o incremento da "segurança europeia" e da NATO, nas suas fronteiras. Ambos, nestes 25 anos últimos, assistiram á ascensão dos USA a "potência única" e "polícia mundial", pouco depois á sua queda num mundo incontrolável e apolar e finalmente a uma situação de "império moribundo", que arrasta perigosamente a sua hegemonia entre convulsões de apatia e assomos de esclerose.

Os acontecimentos de Maidan (tal como as Primaveras Árabes e outros cenários) revelam uns USA com capacidade de infiltrar as dinâmicas internas nos momentos em que estas se cruzam com as dinâmicas externas, mas já incapazes de controlar "per si" estes processos. A actual situação ucraniana é, em grande parte, consequência destes processos.

Não serão em ultima análise a Pax Germânica nem a Pax Russa, ou muito menos um novo Pacto Russo-Germano (de triste memória e trágicas consequências) que poderão devolver a paz à Ucrânia e a resolução dos problemas das autonomias ou das aspirações independentistas, mas sim a soberania popular. Aliás, a paz, aquela que é efectiva e sincera só é possível de alcançar através da vontade dos povos e do respeito pelas suas soberanias.

Tudo o resto são fórmulas de gabinete... e que trazem consigo o cheiro nauseabundo dos genocídios da paz podre...

Bibliografia
Coehen, S. Soviet fates and lost alternatives: from Stalinism to the New Cold War Princeton University Press, 2013
http://www.democracynow.org
http://www.thenation.com
http://www.rebelion.org
http://www.pagina12.com.ar
http://www.lavanguardia.com

Washington Post, Archives
The New York Times, Arvhives
The Guardian, Archives

E SE OUTRO DINHEIRO FOR POSSÍVEL?




Tentativa de sufocar financeiramente a Grécia demonstra: não será possível mudar o mundo sem criar novas relações com moeda e crédito

George Monbiot – Outras Palavras - Tradução: Antonio Martins

Compare as exigências feitas ao governo grego com as facilidades oferecidas aos bancos que provocaram a crise financeira de 2008. Os ministros da zona do euro insistem na rendição incondicional de Atenas: uma humilhação nacional que zomba da democracia. Mas quando os bancos foram socorridos, os governos inventaram o dinheiro necessário quase sem exigir condição alguma. Pediram timidamente algumas poucas reformas; e fingiram que não viram, quando os banqueiros as desrespeitaram.

O governo alemão, que agora dedica-se a infernizar a vida no sul da Europa, apenas arranhou seus próprios bancos. Como relatou o New York Times, embora o corrupoto sistema bancário alemão “necessitasse de um resgate maior que o destinado aos bancos norte-americanos”, “houve pouco apetite para mudanças, porque o sistema bancário está imbricado demais com a política, servindo como fonte permanente de patrocínio e financiamento para projetos locais”.

Os gregos estão certos, quando reclamam que foram reduzidos a súditos coloniais, mas os senhores não são os governos no Norte da eurozona. São os bancos privados. Os governos que parecem determinados a destruir um Estado soberano por sua ousadia são apenas intermediários do poder.

Nada disso procura negar a corrupção e promiscuidade fiscal dos governos gregos anteriores. Mas enquanto os bancos escaparam, tendo praticado atos muito piores, os valentões da eurozona insistem em extrair até a última gota de sangue dos povos que não foram responsáveis pela irresponsabilidade de seus governos.

A Grécia chegou ao fim da linha – é o que se diz. Talvez. Ou, talvez, haja possibilidades que ainda não examinamos com atenção, espaços para esperança em meio à ruína.

Uma ideia radical, sobre dívida e dinheiro, foi proposta há alguns meses por Martin Wolf, editorialista do Financial Times. Ele propõe retirar dos bancos privados seu notável poder de criar dinheiro a partir do nada. Por poderem emitir crédito, eles fornecem entre 95% e 97% do dinheiro disponível nas sociedades. Se os Estados estabelecessem monopólio na criação de dinheiro, os governos poderiam ampliar a oferta sem criar dívida. A senhoriagem (diferença entre o custo de produzir dinheiro e seu valor) favoreceria o Estado, somando bilhões aos cofres públicos. Os bancos seriam reduzidos a servidores, e não mais senhores, da economia.

Um enfoque inteiramente distinto foi proposto por Ann Pettifor, em Just Money — How Society Can Break the Despotic Power of Finance[Dinheiro Justo – Como as sociedades podem quebrar o poder despótico das Finanças, sem edição em português] – um livro fascinante, ainda que mal escrito e caótico. Ela argumenta que os governos não foram capazes de entender o que é o dinheiro. Ele não deveria ser visto como uma mercadoria, argumenta Ann, mas como uma relação social baseada em confiança. Algo raro, para uma crítica radical das finanças, ela enxerga a criação de dinheiro pelos bancos privados como “um grande avanço civilizacional”, à sua época – porque libertou as nações dos usurários que antes monopolizavam e restringiam o acesso à riqueza monetária.

A oferta de dinheiro é, na verdade, ilimitada: enquanto houver atividade produtiva suficiente para absorvê-lo, não há razão óbvia alguma para restringir o volume de dinheiro que pode ser emitido. Portanto, quando os governos e os bancos centrais disserem que o dinheiro acabou, prossegue Pettifor, ou eles estarão mentindo para nós, ou para si mesmos. O que limita a atividade econômica é uma restrição desnecessária e artificial dos meios de troca.

O grande avanço civilizacional da atividade bancária foi destruído por meio de sua desregulamentação, cujo resultado foi uma novo sistema de usura, especulação e exploração. Os bancos privados emprestam por muito o dinheiro que recolhem por quase nada, forçando-nos a trabalhar cada vez mais e a devastar ainda mais a natureza para honrar nossas dívidas. Pettifor sugere que os governos deveriam reassumir o controle sobre as taxas de juros em todos os níveis das operações de crédito.

Mas é possível que as maiores transformações possam se dar em plano local. A Grécia já tem algumas moedas locais, que mantiveram a circulação de dinheiro em diversas cidades, já que não podem ser recolhidas (há sistemas similares em muitos países). Mas, estranhamente, ainda não se utiliza um sistema marcante e transformador que por pouco não salvou a Europa do fascismo: a moeda desenvolvida pelo economista Silvio Gesell, baseada num vale-selo. Ele é explicado em The Future of Money, um livro magnífico de Bernard Lietaer.

Em sua forma original, o vale-selo era um pedaço de papel onde estavam impressos diversos quadradinhos. A moeda perdia validade exceto se um selo, que custava 1% de seu valor, fosse fixado num dos quadradinhos, a cada mês. Em outras palavras, a moeda perdia dinheiro ao longo do tempo, de modo que não havia incentivo para acumulá-la. Projetos de vale-selo multiplicaram-se na Alemanha e Áustria, quando as moedas nacionais entraram em colapso no início dos anos 1930. Em 1932, por exemplo, a cidade austríaca de Wörgl quase quebrou, por se tornar incapaz de financiar as obras públicas, ou de apoiar sua população empobrecida. Até que o prefeito soube da proposta de Gesell.

Ele usou os poucos fundos que restavam nos cofres públicos como garantias para os vales-selos – e usou-os para pagar uma obra. Os trabalhadores faziam a moeda circular tão rapidamente quanto possível. Como mágica, este pequeno volume de dinheiro manteve-se em circulação, permitindo que Wörgl repavimentasse suas ruas, reconstruísse o sistema de abastecimento de água, construísse novas casas, uma ponte e até uma pista de ski. Nos 13 meses que durou a experiência, as notas circularam centenas de vezes, criando entre 12 e 14 vezes mais emprego do que teria feito a moeda convencional. O desemprego acabou, e a venda de selos garantiu, sozinha, um restaurante gratuito que alimentava 220 famílias.

Os governos da Alemanha e da Áustria, profundamente ameaçados pelo sucesso destes projetos, liquidaram-nos. O emprego desabou de novo, e um pintor austríaco, tresloucado porém carismático, encontrou o caminho para o poder que buscava há muito.
Quando o grande economista norte-americano Irving Fisher examinou estes experimentos, ele concluiu que “a aplicação correta do vale-selo revolveria a crise de depressão nos Estados Unidos em três semanas. Mas o governo de Roosevelt, ciente de que tais moedas poderiam acarretar, para o governo federal, vasta perda de poder, prontamente as baniu.

Tais ideias poderiam ser úteis para a Grécia e outros países. Não sei. Mas se Atenas abandonar o euro, talvez possa se abrir um mundo de possibilidades, para as quais temos permanecido de olhos fechados.

UM BORDEL CHAMADO… PORTO




O Executivo da Câmara Municipal do Porto, presidido por Rui Moreira, vai distinguir Sindika Dokolo com uma medalha de mérito por patrocinar uma exposição assente na sua própria colecção de arte africana contemporânea. Só faltará dar o nome de José Eduardo dos Santos ao Estádio do Futebol Clube do Porto. Aliás, há muita boa gente a sugerir também que a Ponte da Arrábida passe a chamar-se Ponte Isabel dos Santos.

Orlando Castro

Entretanto, a vereadora do PS na Câmara do Porto, Carla Miranda, deu uma no cravo e outra na ferradura ao criticar hoje o princípio subjacente à decisão de atribuir a medalha de Mérito Grau Ouro ao coleccionador de arte casado com a nossa rainha santa Isabel (dos Santos).

O Executivo aprovou hoje por unanimidade, em reunião privada da câmara, atribuir esta medalha de ouro ao coleccionador de arte, marido de Isabel dos Santos, que vai apresentar na cidade uma exposição de arte contemporânea.

Numa atitude de gato escondido com rabo de fora, a vereadora do PS votou favoravelmente esta proposta mas – repare-se – tem “dúvidas se será suficiente para receber esta medalha apenas vir ao Porto divulgar o seu património”.

“Existe um regulamento para atribuição de medalhas e para as de mérito é bem claro: ela deve ser dada a quem tenha praticado actos com assinaláveis benefícios para a cidade. Precisaríamos de mais benefícios para a cidade e para a população para lhe atribuir esta medalha”, disse a vereadora socialista.

Que maior acto de benefício para a cidade do Porto em particular, e em geral para todo o país, do que ser genro do presidente no poder desde 1979 sem nunca ter sido nominalmente eleito? Ou marido de uma multimilionária que começou a ganhar umas massas vendendo ovos nas ruas de Luanda?

Sindika Dokolo nasceu no antigo Zaire, actual República Democrática do Congo, e foi educado pelos pais na Bélgica e em França, tendo começado aos 15 anos a constituir uma colecção de obras de arte, por iniciativa do pai, refere o texto laudatório, bajulador e servil da autarquia.

“Em Luanda, constituiu a Fundação Sindika Dokolo, a fim de promover as artes e festivais de cultura em Angola e noutros países, com o objectivo de criar um centro de arte contemporânea que reúna não apenas peças de arte contemporânea africana, mas que, além disso, providencie as condições e actividades necessárias para integrar os artistas africanos nos círculos internacionais do mundo da arte”, acrescenta o panegírico submisso e de clara bajulação da Câmara Municipal do Porto.

A justificação apresentada por Rui Moreira, um cada vez mais visível apologista da autocracia do seu amigo Eduardo dos Santos, para tão importante distinção a alguém que não tem qualquer ligação à cidade é de ir patrocinar a apresentação da exposição “You Love me, You love me not”, marcada para Galeria Municipal Almeida Garrett, no próximo dia 5 de Março.

Rui Moreira diz ainda que “com este gesto de grande generosidade, Sindika Dokolo, permite à cidade do Porto desenvolver um dos projectos mais relevantes no âmbito da arte contemporânea da actualidade, ajudando a estabelecer uma ponte singular entre a cidade e o mundo”.

Por este andar não tardará que o MPLA retribua com a atribuição a Rui Moreira da medalha da democracia e do Estado de Direito que Angola não é.

Nos negócios, faceta que é muito cara a Rui Moreira, o marido de Isabel dos Santos tem sucesso, mesmo quando as transacções são opacas. Há um ano, a revista Forbes revelou que Isabel dos Santos, através de Sindika Dokolo, em parceria com o Estado angolano, adquirira a joalharia suíça De Grisogono, uma marca conhecida por ter como clientes grandes estrelas mundiais do cinema e da moda, como Sharon Stone e Heidi Klum, num negócio pouco claro, que permitiria a canalização dos diamantes angolanos para aquela joalharia.

Em Novembro de 2013, Rafael Marques, em entrevista à Deutsche Welle, explicou que “este negócio não envolveu um centavo da família presidencial, é em troca de diamantes angolanos”, frisando que “temos aqui um processo em que os diamantes angolanos estão a beneficiar directamente a família presidencial e não os cofres do Estado”.

É caro que, como diz Rafael Marques, “a elite angolana, para saquear o país à vontade, precisa do apoio de Portugal. Mas Portugal tolera isso, porque é a forma que encontrou de ser chamado para participar do saque de Angola”.

E do ponto de vista da Câmara Municipal do Porto, o importante não são os milhões de angolanos que passam fome mas, isso sim, os poucos membros do clã presidencial que têm milhões e que, com isso, tanto compram joalharias, jornais, medalhas ou… lavandarias.

Folha 8 Diário (ao)

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Portugal. ESTAVA MORTO NUMA MACA NO CORREDOR DA URGÊNCIA DE AVEIRO




Um homem de 77 anos foi, esta terça-feira, encontrado morto na Urgência do Hospital de Aveiro, por familiares de outros doentes

José Malaquias, que residia no Largo de S. José, em Ílhavo, encontrava-se numa maca desde o dia anterior, altura em que deu entrada no hospital, cerca das 17.30 horas, pelas mãos dos Bombeiros de Ílhavo.

Estava num corredor da Urgência de Medicina, juntamente com outros doentes, quando morreu, cerca das 15.45 horas. Foi uma acompanhante de outro doente que, desconfiando do estado de José Malaquias, alertou médicos e enfermeiros, que o levaram para o interior da Urgência de Medicina, desconhecendo-se há quanto tempo estaria morto.

"Os médicos ainda tentaram reanimá-lo, mas não conseguiram", disse ontem à noite uma fonte oficial do Centro Hospitalar do Baixo Vouga.

Ainda segundo a mesma fonte, só hoje os responsáveis do hospital irão decidir se há ou não motivos para a instauração de um inquérito.

João Paulo Costa – Jornal de Notícias – Foto Tony Dias / Global Imagens

Portugal. FALTA DE MÉDICOS OU FALTA DE DINHEIRO? - 1



José Manuel Silva* - Jornal de Notícias, opinião

O primeiro-ministro afirmou que não foi por falta de dinheiro que os hospitais evidenciaram, num ou noutro caso, menos recursos médicos do que aqueles que eram necessários. Tal afirmação é contrária à verdade. É fácil demonstrar.

Na Saúde, como se sabe, faltou dinheiro em todos os setores! Veja-se:

- Faltou dinheiro para contratar milhares de enfermeiros, assistentes operacionais e técnicos, nutricionistas, psicólogos, etc.

- Faltou dinheiro para impedir as faltas de material clínico e medicamentos em hospitais e centros de saúde e para manter atualizado o parque tecnológico da Saúde.

- Faltou dinheiro para evitar o encerramento de centenas de camas de doentes agudos, obrigando ao indigno e desumano internamento em macas.

- Faltou dinheiro para abrir mais camas de Cuidados Continuados e impedir a permanência de casos sociais internados nos hospitais.

- Faltou dinheiro para criar condições para que os doentes dos Cuidados Continuados sejam tratados das suas "febres e descompensações" na própria instituição, sem necessidade de envio às urgências.

- Faltou dinheiro para manter os centros de Saúde abertos em horário alargado e para prosseguir a Reforma dos Cuidados de Saúde Primários.

- Faltou dinheiro para fazer obras em serviços de Urgência claramente subdimensionados para a população que deviam servir.

- Faltou dinheiro para não cortar ou reforçar os apoios sociais e domiciliários à nossa população idosa e carenciada, que vive quase sempre sozinha e sofre muito frio no Inverno, adoecendo com mais facilidade e mais gravemente. Portugal tem o coeficiente mais elevado de desigualdade de distribuição de rendimentos na Europa!

- Faltou dinheiro para planear adequadamente o inverno, etc., etc.

E quanto aos médicos? (ler próximo artigo).

*Bastonário da Ordem dos Médicos

Portugal. Violência contra profissionais de saúde mais que duplicou em 2014




A Direção-Geral de Saúde registou, até outubro de 2014, 477 casos de violência contra profissionais de saúde, superando desde logo o dobro dos episódios registados em todo o ano de 2013, que se fixaram em 202 casos.

Entre janeiro e outubro de 2014, a DGS registou 477 notificações de violência contra os profissionais de saúde no local de trabalho. Este número tem vindo a aumentar desde 2007, ano em que se somaram 35 casos.

Em 2013, as notificações, realizadas no site da DGS, de forma voluntária e anónima, foram feitas na sua maioria por profissionais de saúde do sexo feminino.

A Administração Regional de Saúde do Centro (ARSC) apresentou o maior número de notificações, em 2013 (87), seguida da ARS de Lisboa e Vale do Tejo, com 69 notificações.
Das 202 notificações de 2013, o espaço físico mais referido, segundo a DGS, foi "a consulta externa" e os "serviços médicos", com 59 e 19 episódios respetivamente.

Em 2013, 45% dos agressores eram doentes, 34%, profissionais de saúde e, 16%, familiares dos doentes, informou a DGS, num relatório.

Mais de metade dos agressores são do sexo feminino e o grupo "etário predominante é de 40 a 49 anos, seguido do grupo etário de 50 a 59 anos".

De acordo com a DGS, 81 profissionais de saúde alvo de violência no local de trabalho declararam-se muito insatisfeitos quanto "à gestão do episódio de violência por parte da instituição" onde os atos se verificaram.

Além de os profissionais acabarem por "reportar mais" estas situações, o aumento poderá estar relacionado com um motivo "mais indireto, que é a situação global que as pessoas estão a viver", disse à agência Lusa Carlos Cortes, presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos (SRCOM), que organiza esta terça-feira, às 21 horas, em Coimbra, um debate sobre a violência contra os profissionais de saúde.

"As pessoas estão insatisfeitas no seu dia-a-dia e expressam com violência as suas emoções no hospital e nos centros de saúde", explanou, sublinhando que os utentes também se mostram "insatisfeitos com aquilo que lhes está a ser dado", em termos de cuidados de saúde, havendo "dificuldades nos transportes, na aquisição de medicamentos e pagamento das taxas moderadoras", apontou.

A própria Ordem dos Médicos tem-se apercebido de um aumento de situações de "violência física e psicológica", estando a constituir um grupo multidisciplinar, dentro da secção, para responder a estes casos.

Carlos Cortes salientou ainda que as próprias instituições têm de "dar apoio ao profissional", sendo reportado à Ordem que, muitas vezes, as vítimas deste tipo de violência "se sentem desprotegidas".

Jornal de Notícias – Foto Global Imagens

TIMOR-LESTE, UMA DEMOCRACIA ABALADA QUE COMPORTA INCÓGNITAS E TEMORES



António Veríssimo, Lisboa

Não se pense que os timorenses na generalidade reprovam o primeiro-ministro Rui Araújo, nomeado por Xanana e pelas cúpulas da elite do país. Mas há um problema: a posse do cargo que alegadamente exerce não resulta de eleições livres e democráticas mas sim de um golpe de Xanana Gusmão com a cedência e apoio das direções dos partidos da oposição em que as bases partidárias foram ignoradas. Nem essas bases, garante da democracia partidária, foram consultadas. Assim, Araújo, configura um alegado primeiro-ministro de Timor-Leste revel. Por ocupar o cargo à revelia de tudo e de todos, da legitimidade da democracia. O registo em Timor-Leste é de uma democracia abalada que comporta uma grande incógnita e temores.

Rui Araújo merecia muito melhor atitude da parte da direção da Fretilin. A sua qualidade como ser humano e político acaba por ficar manchada perante o golpe consentido e apoiado a Xanana Gusmão. A qualidade como político de Rui Araújo vai ser mostrada nos tempos que se seguem. Permanece a dúvida sobre se de facto ele é o primeiro-ministro timorense ou se Xanana Gusmão o vai atropelar e o está a usar como fachada para avançar numa nova deslealdade e trafulhice para com a democracia e os timorenses. O tempo o dirá e Araújo tem, pelo menos, o dever de denunciar toda e qualquer tentativa que lhe coarte as funções para que foi nomeado como primeiro-ministro.

Nestes últimos dias ocorreu uma peripécia ridícula que veio comprovar uma vez mais quem quer, pode e manda em Timor-Leste. A ex-ministra da justiça, Emília Pires, alegadamente envolvida em atos de corrupção e acusada pela justiça, viu o seu passaporte retirado por ordem judicial. Todavia, poucas horas depois, o passaporte foi-lhe devolvido por ordem de Xanana Gusmão, alegadamente por a ex-ministra ter de viajar com ele para África numa visita de Estado. Surge a dúvida legítima sobre quem é o primeiro-ministro. Sobre se realmente Emília Pires é ex-ministra ou ministra encapotada neste pseudo novo governo. Dúvidas ainda sobre as interferências de Xanana no setor da justiça, que devia ser um poder independente. Acresce que as declarações de Xanana Gusmão sobre a viagem de Estado a África com a declarada ex-ministra são de um verdadeiro primeiro-ministro autoritário, como sempre.

Referiu Xanana nessas declarações, reportadas pela comunicação social, que "Apareceu nos jornais que estou a ajudar a senhora Emília a fugir. Vim esclarecer que se ela quisesse fugir não tinha voltado. Ela foi a Washington, voltou de Washington e não esteve lá a passear". Se na realidade essas acusações fizeram parte de notícias ou rumores em Timor-Leste a sua origem é descabida. Emília Pires não precisa de passaporte para sair de Timor-Leste se precisar ou quiser fugir da ilha. Tem capacidades financeiras e amizades que num esfregar de olhos possibilitarão a fuga da alegada ex-ministra. Acresce que no futuro se poderá concluir que Emília não teme a justiça e a ação penal que possa decidir sobre a sua condenação e liberdade. A montanha vai parir um rato no que concerne às acusações, provas e julgamento de Emília Pires. A impunidade prevalecerá mesmo que ela seja uma criminosa. É o costume, salvo raras e honrosas exceções. O primeiro-ministro de facto, Xanana Gusmão, não ficou no governo por acaso. E é ele que quem pode e manda. Até ver, com cobertura da oposição.

A confirmar-se esta verdadeira fantochada com um “novo” primeiro-ministro, não eleito democraticamente, será a Fretilin e Rui Araújo que sairão chamuscados ou até esturricados de toda a anómala situação. Nesse caso a responsabilidade caberá em grande parte à direção da Fretilin, a outra grande parte vai direitinha para a responsabilidade do presidente da República, Taur Matan Ruak. Ao invés, se nem Rui Araújo, nem restantes responsáveis pela sua nomeação como primeiro-ministro, constatarem interferências e limitações imposta por Xanana Gusmão e o seu aparelho de débito de democracia e honestidade, o país pode vir a registar um saldo positivo nestes pouco mais de dois anos que restam ao recém-governo empossado. Apesar da mácula de não ser um governo democraticamente eleito pelos timorenses. As expetativas residem em muito de positivo no bom caráter e competências de Rui Araújo e na sua qualidade como ser humano, sendo-lhe igualmente reconhecidas aptidões intelectuais e profissionais superiores à média dos timorenses. É isso mesmo que faz de Araújo uma esperança em melhores dias para os timorenses.

No quotidiano em Díli, principalmente, é pronunciado o regozijo pela nomeação de Araújo como PM. Mais vastas e visíveis são as congratulações e as esperanças carregadas de positivismo que podemos ler no Facebook e no Tweetar. Publicamos uma dessas mensagens, escolhida aleatoriamente, que em tétum manifesta o apoio a Rui Araújo.

“Belun sira hotu. Aban, 23 Fevereiru 2015, kompleta semana ida, atan hau simu todan iha kba'as, nu’udar Xefi Governu RDTL nian. Liu husi biban ida ne’e, uluk nia nain, hakarak agradese belun no sidadaun hotu ne’ebé manifesta apoiu iha FB ba nomeasaun no tomada pose VI Governu Konstitusionál, no agradese moos sidadaun hotu ne’ebé, maski la konkorda ho CNRT ninia desizaun, aseita, no foo oportunidade atu governu ne’e hatudu iha pratika ninia kapasidade atu halo servisu. PARABÉNS BA TIMOR-LESTE TOMAK, TAMBA LIU HUSI TRAZISAUN POLITIKA IDA NE'EBÉ PASIFIKU NO ORDEIRU. Aproveita moos atu informa belun sira hotu katak molok 16 Marsu 2015, Governu sei aprezenta programa governasaun ba tinan rua oin mai, no sei aprezenta moos orsamentu ajustadu ba tinan finanseiru 2015. Tuir konstituisaun, Governu iha loron tolunulu atu aprezenta programa governasaun nian ba PN. Realistikamente, tinan 2 bele marka diferensa iha buat balun, maibé bele moos sai limitasaun, hodi bele halo buat hirak ne’ebé presiza tempu naruk. Husu belun sira hotu ninia apoiu, inklui apoiu ho kritika konstrutiva, atu ami, nu’udar ita boot sira nia servidor, bele halo serbisu ho diak. Domingu di’ak ida ba ita hotu. - Leonarda Moniz”.

Esperemos não ver Rui Araújo crucificado e que os atropelos à democracia que se estão a registar em Timor-Leste reservem para as populações um final feliz.

A tolerância, em democracia, deve ser vasta e permitir que o benefício da dúvida prevaleça até prova em contrário. Também é dever dos democratas dispensar atenção cerrada aos ataques ao regime democrático e denunciá-los. Atente-se no modo como Xanana Gusmão fez as recentes declarações. Atente-se como ele comprova ser um possesso pelo poder. Atente-se no seu método cínico de querer condicionar a comunicação social ao “apelar à imprensa timorense para ser mais cuidadosa nas notícias que publica”. Não esqueçamos a lei censória para a comunicação social que é contestada pelos profissionais timorenses, aprovada pelo governo corrupto e deputados de Gusmão.

Benefício da dúvida sim. Ao novo governo. Não a Xanana Gusmão, por já ter gasto todas as hipóteses e a montanha de oportunidades que lhe foram proporcionadas.

Depois de Escrito

Por se encontrar dentro do contexto da opinião acima escrita antes das declarações públicas de Rui Araújo – agora exposta – trago à colação os cinco primeiros parágrafos de uma notícia da Lusa que em baixo publicamos integralmente. Araújo afirma o contrário da incógnita e temores acima manifestados e procura demonstrar que a democracia em Timor-Leste não foi abalada. Talvez até queira insinuar que está viva e de boa saúde. Vejamos os parágrafos referidos.

“O primeiro-ministro timorense rejeitou hoje as opiniões de que o seu antecessor, Xanana Gusmão, mantém o controlo sobre o Governo, explicando que o agora ministro, nas reuniões do executivo, só fala quando é solicitado a intervir.

"Considero uma ideia injusta esses comentários sobre a dominância, a influência de Xanana. Temos que reconhecer que ele tem um papel importante nas decisões do Estado, mas respeita o processo governativo", afirmou hoje Rui Maria Araújo, numa entrevista televisiva.

Rui Araújo tomou posse no passado dia 16 de fevereiro, substituindo Xanana Gusmão como primeiro-ministro, que se manteve no Governo com o cargo de ministro do Planeamento e Investimento Estratégico.

"É claro que em assuntos relacionados com segurança, nos grandes temas de desenvolvimento, precisamos de o ouvir. Mas a conotação de que influencia tudo é errada. Os factos não mostram isto", disse Rui Araújo.

"Tem sentido de Estado. E por isso, embora tenha uma estatura política e histórica, na reunião do Conselho de Ministros só falou quando lhe foi perguntado alguma coisa", afirmou.”

Se Araújo assim declara só temos de acreditar. Por enquanto, nem por sombras devemos duvidar sobre ser ele realmente o primeiro-ministro, quem decide sobre as políticas do governo sob o seu primado. Quanto à colaboração dispensada por Xanana Gusmão, sem duvidar das boas perspetivas de Araújo, o melhor é colocar reticências na pureza e transparência do futuro comportamento de Gusmão.

Quase repetindo o que anteriormente está descrito em cima aclare-se ao modo luso que Xanana Gusmão já comprovou que “não é flor que se cheire” sem que nos habilitemos a que se transforme em vespa e nos descarregue uma brutal ferroada. Fiquemos atentos. Principalmente Rui Araújo, a Fretilin, o PR e os timorenses. Todos não serão demais para evitar que Rui Araújo venha a ser crucificado por ferroadas de Xanana ou de seus correlegionários.

Que o destino destes novos passos no caminho percorrido por Timor-Leste, traçado pela oligarquia, e que os atropelos à democracia que se estão a registar reservem para as populações um final feliz. Uma sociedade mais justa governada no interesse das populações e não no interesse da oligarquia que Gusmão moldou à sua imagem e semelhança, extremamente desonesta.

Fiquemos atentos.

Primeiro-ministro timorense rejeita ideia de que Xanana mantém o controlo do Governo




Díli, 24 fev (Lusa) - O primeiro-ministro timorense rejeitou hoje as opiniões de que o seu antecessor, Xanana Gusmão, mantém o controlo sobre o Governo, explicando que o agora ministro, nas reuniões do executivo, só fala quando é solicitado a intervir.

"Considero uma ideia injusta esses comentários sobre a dominância, a influência de Xanana. Temos que reconhecer que ele tem um papel importante nas decisões do Estado, mas respeita o processo governativo", afirmou hoje Rui Maria Araújo, numa entrevista televisiva.

Rui Araújo tomou posse no passado dia 16 de fevereiro, substituindo Xanana Gusmão como primeiro-ministro, que se manteve no Governo com o cargo de ministro do Planeamento e Investimento Estratégico.

"É claro que em assuntos relacionados com segurança, nos grandes temas de desenvolvimento, precisamos de o ouvir. Mas a conotação de que influencia tudo é errada. Os factos não mostram isto", disse Rui Araújo.

"Tem sentido de Estado. E por isso, embora tenha uma estatura política e histórica, na reunião do Conselho de Ministros só falou quando lhe foi perguntado alguma coisa", afirmou.

Rui Maria Araújo foi o convidado da terceira edição do programa de debate "Talk Show Ita Nia Governo", da Rádio e Televisão de Timor-Leste (RTTL), gravado no auditório do Arquivo e Museu da Resistência Timorense em Díli e moderado por Rui Viana, da secretaria de Estado da Comunicação Social.

Considerando Xanana Gusmão "insubstituível" tanto pela sua "história na resistência" como pela sua "história na governação", Rui Araújo disse que aceitou o convite para ser primeiro-ministro por um sentido de unidade nacional.

E recordou, neste caso, os paralelismos entre o movimento de unidade nacional liderado por Xanana Gusmão há 30 anos - "que levou 15 anos depois à independência" - e o novo esforço de unidade nacional, que pode levar ao desenvolvimento do país.

O VI Governo, disse, nasce de um reconhecimento de que em Timor-Leste é necessário "mobilizar recursos, independentemente dos partidos, para consolidar a agenda de desenvolvimento".

"Precisamos de talentos de todos para desenvolver o país", afirmou.

Sobre a sua própria carreira, e o percurso de médico para a vida política, Rui Araújo explicou que ocorreu com um reconhecimento de que na agenda da saúde pública se pode beneficiar muito mais pessoas do que como médico.

E insistiu na necessidade de implementar em Timor-Leste conceitos de "medicina social", reconhecendo que a saúde depende de ações médicas e serviços, mas mais de "boas práticas de saúde pública".

Uma agenda, disse, que inclui "o desenvolvimento do país, o ambiente, emprego e economia", entre outras questões gerais de Estado.

ASP // JPS – Foto EPA / António Sampaio

Parlamento timorense volta a adiar debate sobre presidente do Tribunal Recurso




Díli, 24 fev (Lusa) - O Parlamento Nacional timorense voltou a adiar, pela segunda semana consecutiva, o debate e votação da ratificação da nomeação do presidente do Tribunal de Recurso, Guilhermino da Silva.

A votação, que esteve inicialmente prevista para a semana passada e que foi adiada para esta - a pedido das quatro bancadas - voltou a ser adiada para a próxima semana.

Apesar de Guilhermino da Silva estar em funções há praticamente um ano - foi nomeado por decreto presidencial a 28 de fevereiro de 2014 - o processo de ratificação pelo Parlamento Nacional, previsto na Constituição, ainda não ocorreu.

A relação entre Guilhermino da Silva e outros membros da magistratura timorense e o Governo e Parlamento Nacional foi afetada pela resolução aprovada pelo Governo e pelo parlamento em outubro do ano passado que determinou uma auditoria ao sistema judicial do país e suspendeu os contratos com funcionários judiciais internacionais, "invocando motivos de força maior e a necessidade de proteger de forma intransigente o interesse nacional".

Dias depois dessa resolução o Governo timorense ordenou a expulsão, num prazo de 48 horas, de oito funcionários judiciais, sete portugueses e um cabo-verdiano, o que levou Portugal a suspender o protocolo de colaboração com o setor judicial timorense.

A ratificação do nome do presidente do Tribunal de Recurso implica que estejam presentes na sessão de voto mais de metade dos deputados eleitos (33) sendo exigida, no escrutínio secreto, uma maioria absoluta (descontados votos nulos e brancos).

ASP // JCS

Remodelação governamental em Timor-Leste atrasou envio de docentes - ministério




Lisboa, 23 fev (Lusa) -- O Ministério da Educação justificou hoje o atraso no envio de professores para Timor-Leste com a recente remodelação governamental naquele país, apontando o mês de março como data provável para a deslocação dos docentes.

Uma fonte do gabinete do ministro Nuno Crato confirmou o atraso, justificando-o com a recente remodelação governamental em Timor-Leste.

Alguns docentes contaram hoje à Lusa que quase 50 professores que foram contratados em setembro do ano passado para lecionar em Timor-Leste estão em casa, em Portugal, a receber, à espera de seguir para o país.

"De facto, a situação está ligeiramente atrasada devido à recente remodelação governamental que se verificou em Timor-Leste e consequente alteração do titular da pasta da Educação. Esperamos que este assunto se resolva o mais rapidamente possível para que os docentes portugueses possam ir para Timor-Leste nas duas primeiras semanas de março", adiantou a mesma fonte do Ministério da Educação.

É o segundo ano consecutivo de atrasos no envio, pelo Ministério da Educação português, dos professores para Timor-Leste, no âmbito do protocolo que prevê o destacamento de docentes em onze escolas de referência - e mais duas que devem ser abertas este ano.

Inicialmente, o Ministério da Educação, em Lisboa, informou os docentes de que o atraso se devia à falta de protocolo (o anterior terminou em setembro do ano passado) mas mesmo depois da nova versão ter sido assinada, a 2 de janeiro, os professores ainda não seguiram para Timor-Leste.

Antonieta de Jesus coordenadora do Projeto das Escolas de Referência, disse à Lusa, em Díli, que o processo do envio dos professores "está a ser finalizado", garantindo que ainda não recebeu qualquer lista com os docentes.

"Timor-Leste paga as viagens, como sempre pagou. Mas até agora Portugal ainda não mandou a lista dos professores. Assim que enviarem a lista, trataremos das viagens", garantiu, remetendo mais comentários para os Ministérios da Educação dos dois países.

O processo do envio destes professores para Timor-Leste sofre atrasos e problemas desde o ano letivo passado, quando as escolas de referência viveram sem parte dos professores previstos durante todo o ano.

Nas 11 escolas existentes - sediadas em 11 capitais de distrito - Bacau, Same, Maliana, Oe-cusse, Ermera, Aileu, Liquiçá, Lospalos, Suai, Dili e Manaauto e com mais de 3.500 alunos timorenses - deveriam ter sido colocados 150 professores, mas 60 deles nunca chegaram a Timor-Leste.

O VI Governo Constitucional de Timor-Leste, liderado por Rui Maria Araújo e formado por 38 elementos, tomou posse na semana passada numa cerimónia presidida pelo chefe de Estado, Taur Matan Ruak, no Palácio de Lahane, nos arredores de Díli.

Fernando La Sama de Araújo é o ministro de Estado, Coordenador dos Assuntos Sociais e da Educação.

DD (ASP) // JPS

Corrupção em Timor-Leste não precisa de leis fortes mas de forte implementação das leis - PM


A corrupção tem vindo a aumentar até à atualidade

Díli, 24 fev (Lusa) - O chefe do Governo timorense considerou hoje que Timor-Leste tem leis suficientemente fortes para lidar com a corrupção e as irregularidades no setor público, considerando que falta é uma "forte implementação da lei".

"A estratégia mais importante contra a corrupção é a lei. Na gestão das despesas públicas, no processo de aprovisionamento, há regras. Temos que as cumprir. E, se houver irregularidades, investigar e aplicar a lei", disse Rui Maria Araújo.

"Não concordo com essas opiniões de que as leis não são fortes. A lei é suficiente. A implementação da lei é que não é forte. Há uma grande sensação de impunidade na sociedade", afirmou.

Rui Maria Araújo foi o convidado da terceira edição do programa de debate "Talk Show Ita Nia Governo", da Rádio e Televisão de Timor-Leste (RTTL), gravado no auditório do Arquivo e Museu da Resistência Timorense em Díli e moderado por Rui Viana, da Secretaria de Estado da Comunicação Social.

Questionado sobre vários aspetos da sua estratégia de governação, Rui Araújo disse que, no combate à corrupção, o executivo vai simplesmente "aplicar as leis".

O primeiro-ministro disse que depois da violência de 1999 e da independência, o país viveu um processo positivo de perdão e reconciliação, muitas vezes através de cerimónias tradicionais.

Ainda que isso tenha sido útil, desde aí deixou "uma impressão de impunidade" que não pode continuar.

Rui Araújo pediu a toda a sociedade - população, funcionários públicos e titulares de órgãos de Estado - que cumpram a sua responsabilidade nesta matéria "relatando factos às autoridades judiciais quando houver indícios, sinais de irregularidade".

"Precisamos de cortar este ciclo. De travar alegações de que servidores públicos cobram por serviços que têm que prestar à comunidade. Se não se denúncia, continuam essas práticas", afirmou.

A nível das finanças públicas, Rui Araújo recordou que há uma "responsabilidade política, administrativa e criminal" associada aos gastos, sendo que os servidores do Estado têm "uma responsabilidade adicional".

A primeira edição do debate que hoje decorreu foi dedicada à polémica lei da comunicação social, a segunda à reestruturação do Governo e a terceira pretendia, com a entrevista ao primeiro-ministro, dar a conhecer as prioridades e objetivos do VI Governo.

Fernando La Sama de Araújo, ministro de Estado, Coordenador dos Assuntos Sociais e ministro da Educação, e Nélio Isaac, secretário de Estado da Comunicação Social, estiveram entre os que acompanharam a gravação do programa.

Desde que tomou posse, há uma semana, Rui Maria Araújo tem levado a cabo várias iniciativas, incluindo visitas surpresa a Ministérios e departamentos governamentais, mensagens para a população pela sua página no Facebook e até a apresentação da sua declaração de bens.

Numa mensagem recente no Facebook confirmou que o Governo tenciona aprovar o seu Programa de Governo no próximo dia 16 de março.

ASP // JPS

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