sexta-feira, 29 de agosto de 2014

RENAMO não inicia campanha sem que acordo de paz seja lei em Moçambique




O líder do maior partido da oposição em Moçambique e candidato presidencial às eleições gerais de 15 de outubro, Afonso Dhlakama, não vai iniciar a sua campanha no domingo (31.08), data prevista para o início dos trabalhos no calendário do processo eleitoral. Em entrevista à DW África, Dhlakama nega estar "em parte incerta", afirmando que está apenas à espera da promulgação da lei do acordo de paz, para sair da Gorongosa e regressar à esfera pública. Para já, o líder da RENAMO quer "garantias" da parte do Governo e, sem demoras, um encontro com o Presidente Armando Guebuza - em qualquer parte do país, mesmo em Maputo - para transmitir confiança à população e aos parceiros internacionais.

DW África: Quando é que sairá do chamado “lugar incerto” onde se encontra, para o convívio com todos os moçambicanos?

Afonso Dhlakama (AD): Não estou num lugar incerto, porque tenho comunicação com os moçambicanos, de Rovuma a Maputo, tenho falado com eles. Estou no distrito da Gorongosa, à espera que os documentos que foram assinados em Maputo sejam transformados em leis pela Assembleia, promulgados pelo Presidente e publicados em Diário da República. Isto é muito importante, não só para mim, mas também para os observadores internacionais e peritos militares. Esta é uma das garantias que eu espero. Não tenho medo de ser assassinado, mas estou a dirigir um partido que diz “pai, não vale a pena, é melhor que as coisas estejam bem”. Acredito que isto acontecerá em breve. Posto isto, não vou poder iniciar a campanha eleitoral no domingo, mas poderei entrar em contacto telefónico, cumprimentar as populações em várias províncias já no dia 31 deste mês.

DW África: Acha que este acordo não será promulgado antes do início da campanha eleitoral?

AD: Penso que não, porque a campanha começa no domingo. Se existir boa vontade por parte do Governo para convocar uma sessão extraordinária da Assembleia dentro destes dias, sim, porque basta os deputados e as comissões fazerem as suas análises e aprovarem e o Presidente da República pode promulgar e mandar publicar. No entanto, como a campanha começa já no domingo, penso que não vai acontecer. Talvez aconteça na segunda ou na terça-feira.

DW África: Este acordo inspira-lhe confiança?

AD: Nós estamos a fazer um esforço para mudar tudo aquilo que inquietava os moçambicanos, que não lhes dava esperança. Estamos a tentar construir uma República sólida, estável, para os moçambicanos e para os parceiros internacionais. Quando exigimos que os documentos entrem na Assembleia da República e sejam promulgados, queremos que eles sejam leis e ofereçam garantias a moçambicanos e estrangeiros. África está assolada de guerra por falta de entendimento e democracia. Eu, em nome do povo e do meu partido, quero que Moçambique venha a ser um país exemplar. Esta é a minha ambição.

DW África: Fora a questão legal, o nível de confiança entre o Governo da FRELIMO e a RENAMO ainda é muito baixo. Porquê?

AD: Por causa da história. Fizemos a Guerra dos 16 anos. Tudo isto que estamos a tentar remendar é algo que foi assinado em uutubro de 1992 em Roma. Mas faltou o cumprimento dos protocolos por parte do Executivo: o exército único e apartidário, eleições livres e transparentes, direitos humanos. Um ano depois, a FRELIMO esqueceu tudo. Não posso esconder: tenho prudência, agora, porque são os mesmos que assinaram o acordo de Roma. Mesmo a população e os estrangeiros observam com uma certa calma. Lembramo-nos da experiência amarga.

DW África: Agrada-lhe a ideia de um encontro simbólico com o Presidente Armando Guebuza?

AD: Penso que este encontro é muito importante, em qualquer parte. Sei que Maputo é onde está o corpo diplomático, é a cidade da imprensa nacional e internacional, é a capital. Por isso, muita gente pensa que o encontro deve ser lá. Não é porque Guebuza mora lá, nem eu estou a ser convidado para a casa do Presidente. Nem eu o posso puxar para a minha casa. No âmbito do impacto, penso que faz sentido ser em Maputo. Mas o vai e vem nas questões da segurança, esta demora, é o próprio Governo que está a atrasar tudo isto. Se o acordo tivesse sido promulgado no dia seguinte, talvez já tivéssemos tido esse encontro. Só exijo garantias de segurança, não quero complicar a situação. Este encontro não é para negociar. É para nos olharmos nos olhos, engolirmos o rancor, esquecermos o passado e transmitirmos confiança à população e aos investidores. Ninguém sabe o que vai acontecer a 15 de Outubro, a RENAMO até pode vencer as eleições e é preciso que Armando Guebuza saiba que não vai ser perseguido. Eu posso vir a ser o Presidente da República e tenho de dizer que vamos governar com reconciliação e justiça. Gostaria que o encontro acontecesse antes mesmo do início da campanha.

DW África: Analistas consideram que, ao convidá-lo para o diálogo, o Presidente e o seu partido estão a tentar projectar-se numa altura de eleições e que a sua recusa em deixar o local onde se encontra também é uma estratégia semelhante, de não deixar todo o protagonismo todo nas mãos de Armando Guebuza. Concorda com esta análise?

AD: Não concordo. As pessoas têm que entender: houve uma guerra. Embora não se queira dramatizar, morreram milhares de tropas governamentais e agentes da polícia de intervenção rápida. Também registámos alguns mortos e feridos e isto deixou o povo assustado. Isto não pode ser levado como uma brincadeira, como algo emocional. É preciso entender que se trata de uma situação de segurança. A minha única estratégia é sair de onde estou de forma segura, com a convicção de que não vou cair numa emboscada e de que a FRELIMO promulgou os documentos. Eu ia ser morto a 21 de Outubro: Armando Guebuza mandou um contingente bombardear para me matar e, se não morri, foi porque não apanhei um tiro. Não me vou esquecer disso só porque há campanha, diplomatas e analistas.

DW África: Recentemente, a imprensa noticiou que Afonso Dhlakama estaria doente. Como está agora de saúde?

AD: Nunca estive doente (risos). Esta é que é a propaganda da FRELIMO, sempre a noticiar que eu estava em Lisboa, na África do Sul, no Quénia, que me escondi depois do ataque porque andava de cadeira de rodas. E eu não sei porque é que fazem esta propaganda. Talvez porque sou importante.

DW África: Em Moçambique, a sociedade civil queixa-se de não ter sido incluída na discussão que culminou com o acordo para o fim das hostilidades e, por isso, receia que o acordo venha a ser mal sucedido. Como é que vê esta reclamação?

AD: Respeito muito a sociedade civil, conheço a sociedade de Moçambique, que tem vindo a crescer nos últimos anos. O problema era entre o Governo e a RENAMO, mas quero crer que a sociedade civil esteve representada, através de mediadores e intelectuais. Alguns são bispos, outros académicos e doutores. Acho que estes intelectuais são todos independentes e fazem parte de organizações da sociedade civil. Não se trata de 50 ou 60 pessoas que tinham que estar no Centro de Conferências Joaquim Chissano. Quero acreditar que a sociedade civil foi incluída através destas pessoas.

Deutsche Welle – Autoria: Nádia Issufo

Moçambique: HAJA CONFIANÇA E DIÁLOGO



Verdade (mz) - Editorial

Decorridos 20 anos de paz, cujos alicerces estremeceram ao longo das duas décadas, as relações entre a Frelimo e Renamo deterioraram-se. Com o tempo, o rumo que a democracia tomou pôs a nu a falta de diálogo e fidúcia de que os partidos políticos enfermam. Activar as kalashnikov para provar que era capaz de parar o país e forçar o regime a governar com probidade e decoro foi a solução encontrada pela “Perdiz”. Décadas de paz foram postas em causa e condenou-se a pátria ao retrocesso.

Entretanto, ao cabo de 72 rondas de conversações entre o Governo e a Renamo é confortável voltar-se a ouvir declarações como estas, de uma das partes beligerantes: “do fundo do meu coração, tudo o que aconteceu durante um ano e meio termina aqui (...) perdão a todos.” Que estas palavras sejam, efectivamente, um sinal de sossego e paz de que os moçambicanos estavam despojados. Que seja o reencontro das famílias que viviam correndo de lés a lés e dos filhos que estavam separados dos seus pais por causa da guerra.

Os problemas de que Afonso Dhlakama se queixava, que custaram vida a vários moçambicanos e resultaram na invalidez de tantos outros são os mesmos que levaram ao que se cunhou de diálogo político. Nada nos garante que os mesmos estejam totalmente ultrapassados, até porque a deterioração das relações entre a Frelimo e Renamo não acabam com o cessar-fogo.

É que não há confiança e diálogo permanente entre os partidos políticos; por isso, ninguém e nada nos assegura que a Renamo não terá mais armas escondidas em parte incerta, pese embora o desarmamento em vista. Foi assim há décadas... Contudo, criou-se uma oportunidade para se mudar o rumo dos acontecimentos e vamos dar tempo ao tempo...

Em Moçambique, não são apenas os partidos políticos que não confiam nas instituições e na obediência às leis; mas deve reanimar a qualquer pessoa ouvir o líder de um partido ao qual se atribui as maleficências a que o país esteve submergido, durante quase dois anos, a comprometer-se com a paz nos seguintes termos: “não haverá nenhuma violação do cessar-fogo do nosso lado.”

Deste modo, um dos desafios que se seguem à declaração de cessar-fogo é cultivar-se a confiança e o dialogo entre as formações políticas. As instituições que velam pela legalidade e pelo interesse público devem, com afinco, garantir, no espírito e na letra, a materialização desse acordo. Nada de espírito de contradição ao que deve ser assumido como sagradas letras.

Às pessoas que estão em frente de tais estâncias, fica o recado de que devem, também, assegurar que no pensamento, no ser e na forma de estar estejam em conformidades com a lei e abdiquem de observar as normas em função das vontades, dos apetites e dos prazeres dos seus sectários. Apesar do receio que temos em relação à concretização destes desideratos, estamos cientes de que a vontade dos homens para o efeito não vai desfalecer diante daqueles que pretendem transformar Moçambique numa república das bananas.

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Moçambique: TUDO A POSTOS PARA CAMPANHA ELEITORAL SEM DESACATOS NEM VIOLÊNCIA




A Comissão Nacional de Eleições (CNE) diz estar tudo a postos para o arranque domingo, dia 31 de Agosto, da campanha eleitoral e realização de todo o processo sem nenhum tipo de desacato nem violência, tanto que desde o início dos procedimentos inerentes às eleições a instituição não recebeu nenhuma reclamação.

Quem assim o diz é o presidente deste órgão eleitoral, Carimo Sau, em entrevista ao “Notícias” que serviu para dar a conhecer o trabalho realizado até ao momento, bem como apresentar as principais linhas de força que orientarão as actividades desta instituição até ao dia de votação, a 15 de Outubro próximo.

“Alegra-nos afirmar que desde o início do cumprimento do calendário eleitoral, a CNE não recebeu nenhuma reclamação. Por exemplo, na fase da recepção das candidaturas, os processos eram verificados logo à sua chegada, o que permitiu a correcção atempada das irregularidades, como vem preceituado na lei eleitoral. Isso contribuiu para a falta de contenciosos eleitorais”, afirmou o Presidente da CNE, visivelmente emocionado com este feito.

Dados em nosso poder indicam que esta foi a primeira vez que tal situação aconteceu. Aliás, nas eleições legislativas, presidenciais e das assembleias provinciais de 2009, o processo de apresentação de candidaturas foi marcado por vicissitudes diversas que culminaram com a “reprovação” de muitas candidaturas. Tal situação, segundo se apurou na ocasião, deveu-se, sobretudo, a diferentes interpretações por causa da legislação sobre a matéria, o que “obrigou” o legislador a proceder à reformulação de alguns artigos que tratam da questão de apresentação e aprovação de candidaturas. 

Face ao “chumbo” em massa de candidaturas, os concorrentes submeteram queixas e reclamações à CNE e ao Conselho Constitucional, a maioria, sem o sucesso desejado.

Na conversa com a nossa Reportagem, Carimo Sau fez ainda questão de falar sobre o recenseamento eleitoral, recordando que nele foram registados mais de dez milhões de eleitores, o que corresponde a 89% do total de eleitores previstos de mais de 12 milhões. Terminado este processo foi divulgado o número provisório de mandatos, o que permitiu a realização de inscrição pelos partidos políticos, coligações de partidos políticos e grupos de cidadãos eleitores proponentes.

De 20 de Maio a 21 de Julho de 2014, decorreu na Comissão Nacional de Eleições o processo de apresentação e recepção de candidaturas, listas plurinominais fechadas para fins eleitorais para deputado da Assembleia da República e para membro das assembleias provinciais. Neste período, a CNE recebeu candidaturas de 30 proponentes, dos quais 27 de partidos políticos, duas de coligações e uma de um grupo de cidadãos eleitores proponentes.

Este processo foi antecedido da inscrição dos proponentes para as eleições presidenciais, legislativas e das assembleias provinciais, bem como dos respectivos mandatários feita de 5 a 19 de Maio de 2014, na sede da Comissão Nacional de Eleições.

Neste período, a CNE recebeu 35 pedidos de inscrição, dos quais 30 de partidos políticos, 3 coligações de partidos políticos e 2 de grupos de cidadãos eleitores proponentes.

A CNE já afixou as listas dos candidatos dos trinta concorrentes que vão participar nas eleições do dia 15 de Outubro e o sorteio das candidaturas admitidas bem como o respectivo sorteio dos tempos de antena.

ESTAMOS ABERTOS A COLABORAR

A Comissão Nacional de Eleições (CNE) encontra-se aberta a apoiar os partidos políticos, coligações de partidos e grupo de cidadãos concorrentes às eleições de 15 de Outubro para o esclarecimento de qualquer que seja o assunto relacionado com o processo.

A abertura foi manifestada pelo Presidente do órgão eleitoral na conversa com a nossa Reportagem, tendo afirmado que para viabilizar a campanha eleitoral a CNE procedeu já à distribuição dos fundos de financiamento público para a campanha eleitoral. Aliás, Sau sublinhou o facto de os órgãos eleitorais terem realizado todo o trabalho preparatório para que a campanha eleitoral, que começa este domingo, dia 31 de Agosto, decorra sem sobressaltos e dentro de um clima de ordem e tranquilidade.

“Para tal, a CNE aprovou uma série de códigos de conduta que servem para orientar o trabalho dos nossos colaboradores (ver caixa ao lado), bem como dos concorrentes às eleições, quer em tempo de campanha eleitoral, quer durante a votação”, afirmou o líder da CNE.  

Por outro lado, Carimo Sau disse que havendo necessidade de formação de quadros da CNE e dos seus órgãos de apoio, no quadro da implementação do calendário de sufrágio eleitoral para as eleições presidenciais, legislativas e das assembleias provinciais, o órgão que dirige realizou três formações por região, sendo região sul de 16 a 18 de Junho na cidade de Xai-Xai, abrangendo as províncias de Inhambane, Gaza, Maputo e cidade de Maputo; região centro, nos dias 26 a 28 de Junho, na cidade da Beira, abrangendo as províncias de Tete, Manica e Sofala; e, por último, na região norte, na cidade de Nampula, do dia 30 de Junho a 2 de Julho, abrangendo as províncias de Niassa, Cabo Delgado, Nampula e Zambézia. 

“Nos três eventos foram abordados temas sobre a legislação eleitoral aprovada e republicada este ano pelo Parlamento, planificação e preparação das actividades eleitorais para a fase de campanha eleitoral e votação; procedimentos de apuramento parcial, distrital e provincial dos resultados de votação; a arrumação e envio dos materiais para as comissões provinciais de eleições e para a Comissão Nacional de Eleições, entre outros”, disse.

Referiu ainda que de 21 a 22 de Julho último a CNE, em parceria com o Centro de Estudos dos Direitos Humanos da Universidade Eduardo Mondlane, promoveu a capacitação dos formadores nacionais da Polícia da República de Moçambique sobre a legislação eleitoral. Para além do pacote eleitoral, os formandos debruçaram-se sobre a segurança eleitoral.

Refira-se que esta formação foi recentemente replicada pelos formadores nas províncias e distritos.  

APROVADAS MAIS DE 17 MESAS DE VOTAÇÃO

A Comissão Nacional de Eleições aprovou um total de 17.199 mesas de voto que irão funcionar no processo eleitoral de 2014. Estas mesas, que serão assistidas por sete elementos cada, constituem um novo “record” de instalação de mesas de voto se se considerar o número usado em eleições anteriores. Aliás, o número de Membros das Meses de Voto (MMVs) que vai trabalhar neste processo – cerca de 121 mil – também é uma nova marca, isto devido à alteração introduzida na lei que faz com que o número de MMVs por mesa passe de cinco para sete, sendo três indicados pelos partidos políticos com assento parlamentar.

Com vista a preparar este pessoal, o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE), organismo que assiste tecnicamente a CNE, iniciou já com o processo de recrutamento e formação dos MMVs. Assim, serão recrutados pouco mais de 130 mil elementos, dos quais deverão ser seleccionados 121 mil. Os restantes ficarão “suplentes” a serem utilizados em caso de necessidade.

E para o estrangeiro, este processo vai decorrer de 1 de Setembro a 14 de Outubro com o recrutamento e selecção dos candidatos aos membros das mesas, formação dos funcionários das embaixadas e consulados, reciclagem dos facilitadores do STAE, bem como a formação, selecção, contratação e colocação dos MMVs. 

De 30 de Junho a 18 de Julho deste ano, iniciou o recrutamento e selecção dos candidatos a agentes de educação cívica, findo este prazo arrancou a formação dos candidatos a agentes de educação cívica e posteriormente a sua selecção e contratação.

CNE REFORÇA REGRAS

Com vista a alterar as regras de “convivência” dos diversos intervenientes no processo eleitoral, a CNE aprovou os códigos de conduta que deverá orientar as actividades dos agentes eleitorais, candidatos, partidos e coligações de partidos políticos e grupos de cidadãos eleitores e da Polícia da República de Moçambique.

Foi igualmente aprovada pela CNE uma directiva sobre o funcionamento dos membros das assembleias de voto.

Numa tentativa de conter algumas das confusões que ocorreram durante as eleições municipais no ano passado, a Comissão Nacional de Eleições (CNE) esclareceu e reforçou as regras sobre quem pode estar perto dos locais de votação, através de uma nova directiva aprovada no dia 15 de Agosto.

A directiva abrange também a conduta no dia da votação e a contagem, a todos os níveis.

Nas eleições municipais de 20 de Novembro de 2013, houve problemas entre a Polícia, delegados e funcionários de alguns partidos, estes últimos sem nenhuma identificação que afirmaram ser “coordenadores dos delegados”, tudo perto das assembleias de voto, o que serviu para intimidar aos membros das mesas e eleitores.

A nova directiva cria “os locais de constituição e funcionamento das assembleias de voto”, que inclui toda a área até 300 metros da assembleia de voto. Cada partido político e cada candidato pode designar um “delegado de candidatura” e um suplente para cada assembleia de voto, mas apenas um deles pode estar dentro da área e o outro deve esperar fora da zona. A observadores e jornalistas credenciados é permitida a permanência nesta área, o mesmo acontecendo com as pessoas nas filas, para votar, mas assim que exercerem o seu direito de voto, devem, imediatamente, abandonar este perímetro.

Na lei eleitoral, revista, é menos claro o posicionamento da Polícia, de modo que a CNE impôs as suas próprias restrições: “O pessoal médico e paramédico está distante da mesa da assembleia de voto e o agente da Polícia mais distante ainda, ou seja, até trezentos metros da assembleia de voto, podendo aproximar-se quando expressamente solicitado pelo Presidente da respectiva mesa.”

Ninguém, à excepção dos membros das mesas de voto (MMVs), pode falar com os eleitores dentro da área. A lei já determina que não pode haver símbolos de partidos, cartazes, músicas ou outras formas de campanha dentro dessa área.

Outra “inovação” deste processo eleitoral é o facto de o “kit” do material de votação incluir um livro de senhas numeradas. Estas, por vezes, têm sido usadas como uma forma de permitir que as pessoas não tenham de ficar na fila formal, mas a CNE sublinha que estas senhas apenas devem ser usadas depois das 18.00 horas, altura em que a assembleia de voto for a encerrar. A lei diz que qualquer pessoa que esteja na fila às 18.00 horas ainda pode votar. Assim, as senhas vão ser dadas apenas aos eleitores que ainda se encontarem nas filas na hora do encerramento da urna.

OS CÓDIGOS

DOS quatro códigos de conduta aprovados pela CNE, destacamos aqui dois, por razões de espaço. São eles o Código de Conduta dos MMVs e dos concorrentes às eleições deste ano. Neste contexto, o dispositivo estabelece os princípios, direitos e deveres de conduta dos Membros das Mesas das Assembleias de Voto em exercício de funções. Assim, os MMVs devem observar a liberdade de actuação, de Justiça, Integridade, Imparcialidade, Transparência, Neutralidade política, Idoneidade, Honestidade, Civismo, Profissionalismo e Responsabilidade;

São direitos gerais do MMVs ser formado e capacitado para as funções que vai exercer; exercer a função para a qual foi designado; ser tratado com respeito, correcção e urbanidade.

São, por outro lado, deveres dos MMVs constituir a assembleia de voto na hora marcada e no local previamente indicado pela Comissão Nacional de Eleições e seus órgãos de apoio; atender com urbanidade e igualdade de tratamento os eleitores e todos os intervenientes do processo; proceder à contagem dos votantes e dos boletins de voto para o apuramento parcial dos resultados eleitorais da respectiva mesa da assembleia de voto. São deveres específicos do MMV controlar na abertura do kit os materiais eleitorais e evitar a circulação indevida dos boletins de voto;denunciar qualquer portador de boletins de voto fora do circuito da mesa da assembleia de voto; ter cuidado com as tintas em uso na assembleia de voto de modo a evitar que apareçam votos nulos por sua culpa ou conivência; entre outros.

No que respeita aos concorrentes, a CNE definiu no respectivo código que estabelece como princípios gerais a paz, integridade, igualdade, democracia, justiça transparência e prevenção de conflito ou violência, credibilidade e aceitação dos resultados eleitorais.

O documento estabelece como direitos e deveres o facto destes serem dotados de um fundo do Orçamento do Estado; realizar livremente a campanha e propaganda política eleitoral, realizar livremente a campanha e propaganda política eleitoral, gozar de igual oportunidade de acesso à cobertura da imprensa por parte dos órgãos do sector público, respeitar as instituições do Estado, municipais, da Autoridade Tradicional, os cidadãos e demais entidades públicas e privadas, pugnar pela credibilização e aceitabilidade dos resultados dos processos eleitorais, entre outros.

BOLETIM MUITO LONGO

Ao todo, 30 partidos vão concorrer nestas eleições, sendo 29 para a Assembleia da República (AR) e 11 só para as assembleias provinciais. Dos 29 para a AR, 14 concorrem pelos 248 lugares disponíveis para o território nacional, pelo que o boletim de voto será longo.

Três outros estão a concorrer para mais de metade dos assentos. Dos restantes, seis partidos concorrem por 93-135 assentos e seis partidos estão a concorrer por 75 ou menos assentos.

Desses 11 partidos que concorrem para as assembleias provinciais, seis concorrem por menos de 150 dos 811 assentos.

Mussá Mohomed - Notícias (mz)

Moçambique: DESNUTRIÇÃO INFANTIL. GOVERNO E UNICEF PROCURAM SOLUÇÕES




Perto de 400 crianças que sofrem de desnutrição infantil moderada e aguda/grave estão cobertas por programas de reabilitação nutricional lançados no distrito da Moamba, província de Maputo, com o objectivo de estimular o seu crescimento saudável.

Trata-se de crianças beneficiárias do suplemento nutricional CSB, uma mistura enriquecida por nutrientes e ministrada a crianças com desnutrição moderada, bem como o suplemento plumpy nut (ATP), destinado a crianças com desnutrição crónica.

O programa inclui acções de demonstração culinária, suplementação com vitaminas e desparasitação com mebendazol e triagens nutricionais.

A iniciativa é levada a cabo pelas autoridades sanitárias em parceria com o Fundo das Nações Unidas para Infância (UNICEF), no âmbito do Plano de Acção Multissectorial para a Redução da Desnutrição Crónica, este último coordenado pelo Ministério da Agricultura em coordenação com o Secretariado Técnico para a Segurança Alimentar e Nutricional (SETSAN).

Foi neste contexto que a cantora e compositora maliana Angélique Kidjo, na qualidade de Embaixadora de Boa Vontade do UNICEF, visitou ontem o Centro de Saúde da Moamba, onde manteve encontros com mães e crianças beneficiárias do projecto.

No local, Angélique Kidjo inteirou-se dos desafios das mulheres e crianças do bairro de Madinguine no combate à desnutrição aguda grave que atinge actualmente mais de 2,8 por cento das crianças daquele distrito.

Segundo a técnica de Nutrição da Direcção Distrital de Saúde e Acção Social na Moamba, Neuza Chilengue, as acções de reabilitação nutricional iniciadas em 2010 naquela zona da província de Maputo permitiram a redução da desnutrição em crianças de oito por cento para 2,8 em quatro anos.

“Temos realizado consultas de criança sadia e fazemos avaliação do estado nutricional, através da medição do peso, altura, perímetro branquial e, se a criança for diagnosticada com desnutrição aguda grave, encaminhamo-la para a consulta de crianças de risco”, explicou a técnica.

A embaixadora da boa vontade do UNICEF defendeu a necessidade de se dar cada vez mais atenção aos problemas específicos da criança que são o futuro do país, frisando que só com acesso à educação, saúde e condições básicas de habitabilidade é que se pode garantir um futuro risonho para as crianças vulneráveis.

“Reconheço o progresso admirável que foi alcançado pelo Governo no seu compromisso com o bem-estar das crianças, mas muito mais pode ser feito para garantir que elas se desenvolvam no máximo do seu potencial”, disse a cantora maliana radicada nos Estados Unidos.

Pelo menos 43 por cento das crianças moçambicanas menores de 5 anos apresentam desnutrição crónica, o mesmo que dizer que elas têm baixa altura e peso para a sua idade, um dos índices mais altos do mundo, apesar do forte desempenho económico e progresso robusto registado em outras áreas relacionadas com a saúde infantil, principalmente a mortalidade infantil, que diminuiu substancialmente na última década.

Notícias (mz)

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Timor-Leste celebra 15.º aniversário da consulta popular, mas a luta continua pelo desenvolvimento




Díli, 29 ago (Lusa) - Timor-Leste celebra sábado o 15.º aniversário da consulta popular que restituiu a independência à meia ilha ocupada desde 1975 pela Indonésia, mas o referendo foi apenas uma batalha ganha numa guerra que continua pelo desenvolvimento do país.

Depois de 24 anos de ocupação indonésia, a ONU propôs em maio de 1999, a criação de uma missão para Timor-Leste para organizar uma consulta popular.

Era a primeira vitória da resistência timorense, depois de mais de 20 anos a lutar pela restauração da independência do país, proclamada unilateralmente a 28 de novembro de 1975, após a saída de Portugal.

Estabelecida em junho de 1999 pelo Conselho de Segurança, a Missão da ONU para Timor-Leste chegou finalmente ao país e inicia o processo de recenseamento, enquanto consegue que as forças favoráveis à independência e os partidos integracionistas assinem um "Código de Conduta para os Participantes na Consulta Popular".

A Indonésia, responsabilizada pela ONU pela manutenção da paz e segurança em Timor-Leste durante a consulta popular e pressionada pela comunidade internacional, nomeia um novo comandante militar.

A votação começa às 06:30 da manhã de 30 de agosto de 1999, cerca de três horas depois de abertas as urnas quase 50 por cento dos eleitores já tinham votado. A participação atingiu os 98,6 por cento.

Mais um gesto da luta timorense que teve consequências imediatas. As milícias pró-indonésias começam os ataques, que aumentaram a 04 de setembro com o anúncio da contagem dos votos. Mais de 78 por centos dos eleitores dão a vitória à independência.

A seguir é lançada uma campanha de violência, destruição, deportações em massa, roubos e incêndios. A população foge para as montanhas e a ONU abandona Díli.

A 15 de setembro, o Conselho de Segurança condena os atos de violência e exige que os responsáveis sejam apresentados à justiça, cinco dias mais tarde entra em Timor-Leste uma força liderada pela Austrália, a Interfet.

Timor-Leste conquista a sua independência a 20 de maio de 2002, mas a guerra continua e para a vencer falta conquistar a mais longa das batalhas, o desenvolvimento do país, que segundo as autoridades timorenses, deverá ser de desenvolvimento médio-alto até 2030.

MSE // EL - Lusa

Indonésia diz que a "história positiva" com Timor-Leste deve servir de exemplo




Jacarta, 29 ago (Lusa) - O ministro dos Negócios Estrangeiros da Indonésia, Marty Natalegawa, considera que a "história positiva" de cooperação entre a Indonésia e Timor-Leste, após 24 anos de ocupação marcados por várias violações de direitos humanos, deve servir de exemplo.

"Desafio quem quiser que me indique outra situação noutra parte do mundo que tenha sido inicialmente marcada por tamanha tristeza, conflito, miséria e perda de vidas humanas (...) e, ainda assim, por mudanças tão transformadoras de forma tão rápida", desafiou o chefe da diplomacia indonésia, em declarações à Lusa em Jacarta.

Timor-Leste celebra sábado o 15.º aniversário do dia do referendo em que mais de 98 por cento dos timorenses votaram na consulta -- termo imposto pela Indonésia, potência ocupante -- sobre o estatuto de Timor-Leste. O resultado em massa a favor de um futuro Estado independente abriu caminho à independência do território, a 20 de maio de 2002.

Marty Natalegawa referiu que todos os seus homólogos que visitam a Indonésia e Timor-Leste dizem que "a transformação na relação [entre os dois países] é uma história que deve ser contada ao resto do mundo".

Em jeito de comparação, o ministro falou num país africano que surgiu de uma divisão e que, segundo as Nações Unidas, está à beira de um colapso.

Três anos após a declaração da independência, o atual conflito no Sudão do Sul já fez 1,5 milhões de desalojados e dezenas de milhar de mortos.

O governante destacou que agora "o povo da Indonésia abraça o povo de Timor-Leste" e "há boa vontade em relação à Indonésia" entre os timorenses.

Após a celebração da independência de Timor-Leste, a Indonésia teve presente que, como "a comunidade internacional iria virar-se para outro lado", "seria deixada para trás, como vizinha", recordou o ministro, justificando a cooperação com Timor-Leste.

OS dois países têm cooperado em várias áreas, desde formação da administração pública, pescas e desenvolvimento regional integrado a educação, existindo cerca de 10.000 timorenses a estudar na Indonésia que pagam propinas como se fossem cidadãos nacionais.

Grande parte dos produtos que circulam em Timor-Leste chegam do único país com o qual a antiga colónia portuguesa tem fronteiras terrestres e o 'bahasa' indonésio é ainda hoje uma língua de trabalho no país, a par do inglês, apesar de as línguas oficiais serem o tétum e o português.

Os governos de Jacarta e Díli resistiram à pressão internacional para a criação de um tribunal internacional para julgar os crimes cometidos em Timor-Leste, preferindo retirar lições em conjunto e superar o passado.

Em 2005, criaram a Comissão da Verdade e Amizade (CVA) para estabelecer uma verdade conclusiva sobre os atos de violência ocorridos antes e depois do referendo de 30 de agosto de 1999, que culminou com a independência de Timor-Leste a 20 de maio de 2002.

A 15 de julho de 2008, a CVA concluiu que os militares indonésios foram responsáveis por violações dos direitos humanos em 1999.

Durante cerca de um mês depois do anúncio dos resultados da consulta popular, mais de mil pessoas foram mortas e centenas de milhar obrigadas a viajar para a Indonésia.

"É claro que há problemas que devem ser resolvidos. Todas as recomendações da CVA para fazer a reconciliação e promover a amizade têm tido seguimento", destacou o governante, quando questionado sobre as pessoas que continuam desaparecidas.

Dos 504 casos transmitidos relativamente a Timor-Leste entre 1980 e 2014, o Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre os Desaparecimentos Forçados ou Involuntários (WGEID) conseguiu resolver 58 a partir de informações de fontes governamentais e 18 com base em dados de outras fontes.

Segundo o relatório sobre direitos humanos de 2010 da Missão Integrada da ONU em Timor-Leste, cujo mandato terminou a 31 de dezembro de 2012, em junho de 2010, "dos 391 indivíduos acusados de crimes graves associados ao período de 1999 continuavam à solta 303".

AYN // EL - Lusa

Margie, a veterana timorense, que escolheu votar no referendo com o coração nas mãos





Díli, 29 ago (Lusa) - A 30 de agosto de 1999, Guilhermina Ribeiro saiu de casa com o coração dividido entre o amor pelas suas filhas e o amor ao seu país, Timor-Leste, mas escolheu votar pela independência de todos os timorenses.

"Era o dia pelo qual todos nós, timorenses, esperávamos, mas, por outro lado, estava dividida, tinha de deixar duas filhas e uma sobrinha para poder exercer o meu direito de voto", recordou à agência Lusa Guilhermina Ribeiro, atual diretora-geral da Secretaria de Estado de Segurança timorense.

Sábado, Timor-Leste celebra o 15.º aniversário da realização do referendo que conduziu à restauração da independência, mas a data serve igualmente para recordar que também iniciou uma onda de violência que provocou mais mortos, mais feridos, mais tristeza e deixou tudo em cinzas.

Os 15 anos passaram, mas Margie (nome de código de Guilhermina Ribeiro durante a luta de resistência à ocupação indonésia ) não esquece o medo e a insegurança que sentiu naquele dia quando ficou dividida entre a "preocupação de mãe e o direito de cidadã".

Antes de sair de casa, Guilhermina Ribeiro deixou uma mensagem às suas filhas e sobrinha: "Se acontecer algo não me procurem vão ter com o padre Mar Queirós (nome de código da resistência timorense dado ao padre Filomeno Jacob Abel)".

Guilhermina Ribeiro sabia que era um alvo. Afinal, aquela veterana timorense pertencia à Frente Clandestina e era, além de motorista, responsável pelos assuntos de informação.

Margie votou e regressou ao refúgio, nas montanhas perto de Dare, mas ao contrário do que pensava, a sua participação na luta pela restauração da independência ainda não tinha acabado. Faltava uma outra tarefa.

"Ao anoitecer (do dia 30 de agosto) recebi uma nota para no dia seguinte ser testemunha e participar na contagem de votos. Pensei que a minha luta tinha acabado, mas ainda tinha outra tarefa testemunhar a contagem de votos", disse.

Uma tarefa difícil para quem era procurada por fazer parte da resistência e sempre ter defendido a independência de Timor-Leste e que obrigou Guilhermina Ribeiro a disfarçar-se de "maria rapaz".

"Vestia-me toda de preto com um casaco com um capuz com que tapava a cabeça", disse, recordando os apertos no coração cada vez que uma urna tinha mais votos integracionistas do que independentistas.

"No final das contas, a 03 de setembro pediram para não voltarmos no dia a seguir. Percebemos que a pró-independência estava a ganhar e iam começar a haver problemas", afirmou.

E, assim foi. A 04 de setembro o resultado do referendo foi anunciado e 78,5 por cento dos timorenses dão a vitória à independência. As milícias indonésias iniciam de imediato uma campanha de violência, destruição, deportação em massa, roubos e incêndios.

A população refugiou-se nas montanhas, a Missão da ONU em Timor-Leste, destacada para a meia-ilha em maio para organizar a consultar popular abandona o país.

Nesse dia, Guilhermina Ribeiro ainda foi ao banco levantou dinheiro e comprou alimentos e medicamentos, depois fugiu para o refúgio, numa zona onde estavam cerca de 300 pessoas, a maior parte dos quais idosos, crianças e mulheres grávidas.

Margie era também responsável pela Organização da Mulher de Timor e ainda não consegue conter as lágrimas quando fala da colega que não conseguiu salvar durante um parto, por causa da falta de assistência médica.

"Para mim a luta só acabou no dia 20 de setembro com a entrada da Interfet (força de manutenção de paz liderada pela Austrália). Nós no cimo da montanha vimos a entrada deles e naquele momento soubemos que ganhámos", afirmou.

Agora, 15 anos depois, Margie não tem dúvidas que a luta valeu a pena, houve pessoas que morreram, outras que continuam desaparecidas, mas também percebeu que a sua luta ainda não acabou.

"A minha luta ainda não acabou. Como mulher, mãe e cidadã vou continuar a contribuir com o melhor que posso e tenho para que Timor-Leste seja cada vez mais um país melhor e para que as mulheres timorenses nunca mais voltem a passar por aquilo que passaram e para que outras continuem este trabalho, esta luta", afirmou.

Guilhermina Ribeiro, com 55 anos, tem cinco filhos, três rapazes e duas raparigas. Todos sobreviveram. As raparigas vivem em Díli, os rapazes em Portugal, Austrália e Irlanda. Todos estudaram e têm vidas independentes.

"Esta foi a minha grande vitória", concluiu.

MSE // EL - Lusa

Maria Laura, a indonésia que queria Timor-Leste independente e que nunca abandonou o país




Díli, 29 ago (Lusa) - Maria Laura é indonésia, mas prefere um nome português para contar a história de amor que a uniu a Timor-Leste, país que sempre quis que fosse independente e onde sofreu por causa da consulta popular.

O amor começou em Surabaya, na Indonésia, quando casou com um mestiço, um luso-timorense, que a trouxe para Timor-Leste em 1993 e onde nasceram todos os seus filhos.

"O meu marido era favor da luta pela independência do país e eu também era contra o regime que naquela altura estava instalado na Indonésia", explicou à agência Lusa Maria Laura, que faz 40 anos no dia 04 de setembro.

Do dia da consulta popular que deu a independência a Timor-Leste, realizada a 30 de agosto de 1999, faz sábado 15 anos, Maria Laura recorda o sofrimento.

"Estava em Díli e fugi para a montanha no dia 29 de agosto às nove da noite. Tinha um filho com dois anos, outro com um e estava grávida de outro", disse num português quase perfeito, que foi aprendendo sozinha por razões profissionais.

Para a montanha, Maria Laura levou uma panela e um bocado de arroz e os filhos. O marido já tinha fugido.

"O meu marido era português-timorense e estava a ser perseguido. Por isso fugiu primeiro. Eu fiquei. Sofri muito. Não havia comida, não havia nada. Dormia na barraca e estava muito frio", recordou.

Maria Laura tomou a decisão de fugir depois de um milícia ter batido à porta de sua casa.

"Nem me quero lembrar. Tapei a boca do meu filho com um pano para não fazer barulho. Estava em casa sozinha", afirmou.

Depois disso, encheu a casa com zinco velho, plantas para parecer que não vivia ali ninguém e fugiu.

A 30 de agosto de 1999 milhares de timorenses foram às urnas escolher a independência de Timor-Leste. A participação foi superior a 98 por cento.

As consequências da sua decisão não se fizeram esperar. No dia 31 as milícias pró-indonésia iniciaram ataques contra a população em vários locais de Timor-Leste. A violência aumentou a 04 de setembro, dia em que foi anunciado o resultado do referendo que deu a vitória à independência.

Na sequência do anúncio dos resultados, as milícias indonésias destruíram, mataram, incendiaram e roubaram. Milhares de pessoas fugiram para as montanhas.

"Fiquei contente quando o resultado da consulta popular foi anunciado", disse. Mas, insistiu, o sofrimento foi grande.

"Depois tudo ficou bem. Senti-me bem porque acabou a confusão. Foi um período difícil", recordou.

Quinze anos depois, Maria Laura não tem dúvidas: "Nunca me fui embora porque sou timorense".

"O meu marido era timorense, os meus filhos são timorenses e eu sou timorense", afirmou.

Para uma felicidade completa, Maria Laura só queria a nacionalidade timorense, um processo que já iniciou, mas que até ao momento lhe parece interminável.

"Continuo a querer viver em Timor-Leste, só saio para ir de férias e regresso logo. Gostava mesmo de ter nacionalidade timorense", concluiu.

MSE // EL - Lusa

"Atribulações" políticas são "naturais" - reconhecem diplomatas, sobre Timor-Leste




Lisboa, 29 ago (Lusa) -- As "atribulações" políticas em Timor-Leste são "naturais", num país que decidiu ser independente há 15 anos, através de um referendo, e que, durante a ocupação indonésia, apresentava uma situação de "subdesenvolvimento económico", destacam dois diplomatas.

A 30 de agosto de 1999, mais de 98 por cento dos timorenses votaram na consulta -- termo imposto pela Indonésia, potência ocupante -- sobre o estatuto de Timor-Leste. O resultado em massa a favor de um futuro Estado independente abriu caminho à independência do território, a 20 de maio de 2002.

"Timor tinha todas as condições para ser um Estado viável e decentemente governado", constata a eurodeputada Ana Gomes, na altura chefe da Secção de Interesses Portugueses em Jacarta, capital indonésia.

Quinze anos passados sobre o referendo, a diplomata acredita que "estava certa" no "otimismo" quanto ao futuro de Timor-Leste.

"Em 2000, havia um médico timorense, hoje há centenas", compara, elogiando "a aposta estratégica" na educação e qualificação dos timorenses, que, mais do que o gás e o petróleo, são "o recurso fundamental" do país.

A criação do Fundo do Petróleo também revelou "noção de que o dinheiro do petróleo não pode ser gasto à toa, tem de ser gerido e investido", uma opção "inteligente, que diferencia Timor de outros casos", avalia.

"Só a independência permitiu que Timor pudesse sair de um estádio de grande subdesenvolvimento económico", corrobora o embaixador José Júlio Pereira Gomes, chefe da Missão de Observação Oficial Portuguesa ao referendo de 30 de agosto.

Em 1999, Timor "não tinha nada, era um país em guerra há 20 e tal anos" e "o pouco investimento que havia era indonésio e ao serviço dos indonésios", recorda.

Desde então, "Timor tem estado a progredir no plano do desenvolvimento económico", acredita o atual embaixador de Portugal na República Checa, reconhecendo que a evolução "vai demorar ainda algum tempo".

Ana Gomes considera "normal" que nem tudo seja um mar de rosas num país que partiu de "um nível de destruição inacreditável" para a independência, há pouco mais de uma década.

"É evidente que o processo de ganhar capacidades de governação ia ser lento e atribulado", frisa, antecipando "mais atribulações" no futuro. "O que era Portugal quando tinha 15 anos de independência?", questiona. "Não acho que essas atribulações não sejam naturais, fazem parte do processo de crescimento", diz.

Pereira Gomes recorda ter ficado impressionado, em 1999, com "a total falta de condições de segurança" para a realização do referendo, mas também com "a determinação dos timorenses" em nele participar, correndo "enormes riscos".

Sacrifício e pragmatismo são as qualidades dos timorenses destacadas por Ana Gomes, que lembra o referendo como um momento"extraordinário".

Portugal revelou "grande capacidade de intervenção" e "mobilização internacional" e soube "ler corretamente a situação na Indonésia, porque era uma janela de oportunidade que dificilmente se voltaria a repetir", destaca, frisando que foi igualmente "essencial a articulação" com a resistência timorense.

Quinze anos volvidos sobre o referendo, Indonésia e Timor estão "a escrever novos capítulos" nas relações bilaterais, disse recentemente o chefe da diplomacia timorense, José Luís Guterres.

"É normal, natural e desejável que Timor e Indonésia se aproximem. É mesmo uma questão essencial para a segurança e o desenvolvimento de Timor", destaca Ana Gomes.

A aproximação entre os dois países "começou quase imediatamente" após o referendo de 1999, recorda Pereira Gomes. Apesar da "herança" de violência, "a liderança timorense percebeu que o que importava a Timor era olhar para o futuro" e manter relações de cooperação com os vizinhos.

"Amiga de Timor", Ana Gomes não deixa de ser "crítica", por exemplo em relação ao posicionamento do país face à entrada da Guiné Equatorial na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.

"O trajeto de sofrimento e de evolução política de Timor não é compaginado com a tolerância e a legitimação da ditadura de [Teodoro] Obiang [presidente da Guiné Equatorial]", denuncia.

SBR // EL - Lusa

TIMOR-LESTE SALVA MAPA DEMOCRÁTICO DO SUDESTE ASIÁTICO




Jacarta, 29 ago (Lusa) - A experiência democrática da jovem nação de Timor-Leste tem-se destacado na região do Sudeste Asiático, onde a maioria dos ensaios de democratização ainda sofrem constantes testes de resistência.

Timor-Leste é o único país do Sudeste Asiático que ainda não foi aceite como membro pleno da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), cujo objetivo político principal é "fortalecer a democracia, melhorar a boa governança e o Estado de Direito e promover e proteger os direitos humanos e as liberdades fundamentais".

Metade dos Estados-membros da ASEAN são liderados por monarquias constitucionais ou regimes comunistas e os valores democráticos apregoados são facilmente postos em causa, como a liberdade religiosa ou o direito à manifestação.

Singapura, o único membro que tem tornado públicas as suas objeções à entrada de Timor-Leste na ASEAN, é considerada um regime semi-autoritário.

As disputas e as tensões políticas persistem entre alguns países da região, o que ameaça a estabilidade regional, e os atos eleitorais são frequentemente manchados por problemas de segurança e acusações de fraude.

A Freedom House, que avalia as liberdades políticas e civis em todo o mundo, aponta, no relatório de 2014, como "não livres" os territórios do Brunei, Laos, Mianmar o Vietname e como "parcialmente livres" o Cambodja, as Filipinas, a Indonésia, a Malásia, Singapura, a Tailândia, Timor-Leste e o Vietname.

Nos últimos anos, apenas a Indonésia foi considerada "livre", mas a adoção em 2013 de uma lei que regula as organizações da sociedade civil foi encarada pela Freedom House como uma porta aberta para os governos dissolverem organizações com as quais não concordam.

O maior país do Sudeste Asiático consolidou a sua democracia ao eleger, em julho, Joko Widodo, um homem de negócios que cresceu em bairros de lata, para Presidente da República, mas, num país onde alguns candidatos distribuem notas de rúpias durante os comícios, as acusações de fraude exigiram a intervenção do Tribunal Constitucional.

Muitos destes jovens países têm uma história recente de guerra, colonização e sucessivas violações de direitos humanos, pelo que o patriotismo e o crescimento económico parecem ser mais importantes do que certas liberdades, ao contrário do que acontece, por exemplo, nos Estados Unidos, cuja identidade se baseia na democracia.

É o caso de vários jovens do Brunei - país que recentemente adotou algumas leis islâmicas consideradas violações de direitos humanos, como amputação de membros por roubo e apedrejamento até a morte por sodomia -, que defendem a lei e o sultão, mostrando-se gratos pelas condições de vida no seu país.

A um ano do esperado nascimento da comunidade económica das nações do sudeste asiático, onde vivem cerca de 600 milhões de pessoas, vários países da região têm registado um crescimento económico e tecnológico significativo, mas a corrupção e a pobreza continuam a ser preocupantes.

O peso das forças militares na política é outra constante na região, sendo o golpe de estado do passado dia 22 de maio na Tailândia o exemplo mais recente, numa altura em que vários ensaios democráticos do Sudeste Asiático registam contratempos.

Apesar de ser a nação mais recente do bloco, com apenas 12 anos, e da falta de quadros, Timor-Leste é um dos poucos casos que mantém um regime partidário a funcionar.

Os processos eleitorais em Timor-Leste têm sido elogiados pela comunidade internacional, embora tenham existido algumas acusações de compra de votos.

Porém, há receios de que a democracia em Timor-Leste se deixe contagiar pelos males da região, sobretudo desde maio de 2014, quando foi aprovada a nova lei da imprensa que permite a um conselho revogar as licenças dos jornalistas e multá-los.

Tal como os seus vizinhos, Timor-Leste apresenta um grande fosso entre as elites e os mais pobres e casos de corrupção, como o da ex-ministra da Justiça, Lúcia Lobato, que foi condenada a cinco anos de prisão e ao pagamento de 4000 dólares.

Na véspera de celebrar o 15.º aniversário do referendo que abriu a porta à independência, em Timor-Leste a luta continua, agora pelo desenvolvimento.

AYN // EL - Lusa

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