No livro “O Império
Colonial em Questão”, organizado pelo historiador português Miguel Bandeira
Jerónimo, é publicado um artigo de António Araújo sobre um relatório militar
que revela que militares portugueses do Esquadrão dos Dragões
participaram num massacre em Angola que envolveu violência extrema e
decapitação dos corpos. O massacre ocorreu a 27 de Abril de 1961.
O fuzilamento com mutilação de cadáveres começou às 10h30 de 27 de Abril de
1961, dois meses após o início da luta armada de libertação em Angola,em 4 de
Fevereiro, na aldeia Mihinjo, a cerca de 20 quilómetros de Luanda. O
relatório, de um capitão dos “Dragões”, unidade do Exército português,
descreve em 11 pontos o massacre. O documento começa por se referir às
explicações forjadas do soba da aldeia à população para a presença no local de
um pelotão de execução do Exército português.
O pelotão de fuzilamento
disparou, com seis pistolas-metralhadoras, sobre os suspeitos de participarem
na luta de libertação nacional. Depois, “avançaram os cortadores de cabeças”,
“avançou o soba”, que “colocou as cabeças nos paus”, “ficaram dois sem cabeça”.
“As cabeças ficaram espetadas pela boca, submissamente viradas para o chão”, o
“clarim tocou”, “e terminou a cerimónia”, lê-se no relatório. Por fim o “soba
falou ao povo, explicando a razão porque tinham ficado dois paus sem cabeça, à
espera dos futuros não respeitadores da lei” e “ao soba eu disse: os corpos
podem ser enterrados as cabeças ficam sete dias, os paus ficam para sempre”,
escreve o capitão do Exército português no relatório. O autor do relatório é o
capitão de cavalaria do 1º Esquadrão dos Dragões que comanda uma “acção
punitiva de pacificação”, segundo o título do documento. O ditador António de
Oliveira Salazar proferiu, a 13 de Abril,14 dias antes desta cerimónia, o
célebre discurso de “andar rapidamente e em força para Angola”, onde foi
formalmente anunciada a intenção de Portugal de expandir a repressão
colonial.
O relatório, revelado pela primeira vez no livro das Edições
70, está no Arquivo da Torre do Tombo, em Lisboa, no espólio da PIDE/DGS, a
polícia repressiva de Salazar. O documento já tinha sido citado,
brevemente, em 2008, no Brasil, por Marcelo Bittencourt, historiador
brasileiro. Para os peritos na História do colonialismo, o relatório é a
primeira prova escrita de que o Exército português participou na execução, com
mutilação de cadáveres, de muitos angolanos que considerados suspeitos de
participar na luta de libertação nacional e confirma as acusações de que essa
foi uma prática generalizada.
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